Então é Natal! Vamos ajudar a levantar novamente a casa da pequena Daniele, destruída pela empresa WPR no último dia 18 no bairro do Cajueiro?
Que
este Natal sirva para aquecer em nossos corações o amor ao próximo e a
luta pela justiça, que cabe a todos nós buscar e defender. Uma das
formas é contribuindo para corrigir a violência contra a família da
pequena Daniele, que fará 10 anos no próximo dia 30 de dezembro. Daniele esperava passar as festas de ano novo em sua nova casa, que seu pai estava construindo no bairro do Cajueiro, em São Luís, mas a empresa WPR Gestão de Portos e Terminais literalmente destruiu seus sonhos. Fica aqui o convite para transformarmos o amor numa ação concreta e
contribuirmos todos para a correção de uma injustiça: vamos ajudar a
levantar esta casa?
Se quiser participar deste sonho e desta luta,
seguem os dados para doação de qualquer quantia na conta de seu pai, que
hoje está zerada. Tudo será revertido para a construção. Vamos lá:
DANIEL AMORIM DA SILVA Banco: Caixa Econômica Federal Agência 0027 Op 013 Conta poupança número 00015522-4
Se preferir contribuir com material de construção, mande uma mensagem "in box" para a página Pela Criação da Resex Tauá-Mirim, que enviaremos o telefone do Daniel.
Vamos devolver o sonho destruído pela ganância e pela ambição de uma
corporação que quer devastar nossa terra e nossa gente! Na foto acima, o
desenho feito por Daniele sobre seu sonho destruído pela WPR, WTorre,
Suzano, com apoio de membros e instituições do Estado. Abaixo, a Carta que ela escreveu ao "Papai Noel" pedindo, "em vez de brinquedo", sua casa de volta. Ao final, os vídeos em que a pequena Daniele conta o drama que as empresas que querem construir um porto no Cajueiro impuseram aos moradores e a destruição de sua casa. Ao final da Campanha, serão prestadas contas de tudo o que foi arrecadado.
"De: Daniele Beatriz Para: Papai Noel
Querido Papai Noel, meu nome é Daniele Beatriz, moro no bairro do
Cajueiro, vou fazer 10 anos em dezembro, e estou escrevendo esta carta
para o senhor, diferente das outras crianças que pedem brinquedos, o meu
pedido é que eu gostaria muito de ganhar uma casa nova, para eu e meus
pais e minha irmã morarmos, porque a casa em que eu moro é emprestada
pela minha avó e a casa está muito velhinha, quase para cair.
O meu pai, que se chama Daniel, construiu uma casa para nós morarmos,
uma casa de tijolo, eu estava muito feliz, estava quase para nos
mudarmos, só faltava o piso e as portas. Mas aí uma empresa que é
WPR contratou uma máquina para derrubar todas as construções de casas e
derrubaram a minha casa. Eu estou muito triste. Tudo o que eu mais quero
é um lugar para mim e para minha família morar. Não quero brinquedo e
nada do tipo, só quero minha casa de volta, esse é o meu pedido para o
senhor Papai Noel".
No Dia Internacional dos Direitos Humanos, coincidentemente o dia em que a governadora Roseana Sarney renunciou ao cargo, confira a matéria da mais recente edição do Jornal Vias de Fato, que conta como o boicote à criação da Reserva Extrativista do Tauá-Mirim e o apoio do Governo a empresas sem nenhum compromisso socioambiental (a não ser na propaganda) também violam a pauta dos Direitos Humanos no Maranhão.
Maranhão urgente!
Governo do Estado e empresas boicotam importante reserva
ambiental de São Luís
Uma recente audiência pública realizada na Assembleia do Maranhão discutiu a violência praticada contra a comunidade do Cajueiro, na zona rural de São Luís, próximo ao Itaqui. O Governo do Estado
e empresários envolvidos no caso não compareceram a esta audiência. Diante disso, as comunidades presentes deixaram a Assembleia e foram ocupar a Secretaria de Indústria e Comércio.
Cajueiro está na área da Reserva Extrativista do Tauá-Mirim, uma necessidade da Ilha de São Luís, que nunca foi criada por depender exatamente do governo do Maranhão, que criminosamente segue boicotando a reserva.
A expectativa agora é de como se comportará o governo de Flávio Dino diante desta grave questão sócio ambiental. A anunciada mudança começara garantindo a vida de muitos ou o lucro de poucos?
A jogada ensaiada entre Governo do Maranhão e grandes
empresas, que atropela e mata comunidades do campo e da periferia das cidades,
povos tradicionais, indígenas e quilombolas está atrás de uma próxima vítima na
área do Porto do Itaqui, na Ilha de São Luís: dessa vez, quem está na mira é a
comunidade do Cajueiro, que pode ser mais uma a desaparecer do mapa caso os
intentos da empresa WPR – na verdade uma empresa de fachada constituída apenas
com a finalidade de construir um grande porto de escoamento da produção da
Suzano Papel e Celulose, da Petrobrás e da soja que devasta o sul do Estado –
sejam concretizados. Para isso, a WPR, que tem por trás a gigante da engenharia
WTorre, conta com o empenho e determinação de órgãos estaduais como as
secretarias de Meio Ambiente (Sema) e de Desenvolvimento, Indústria e Comércio
(Sedinc).
A Sema vem jogando pesado para liberar as licenças
ambientais, mesmo que de forma completamente irregular, sem respeitar e sem
ouvir a comunidade, com ações que beiram (isso se já não houverem cruzado o
limite) a improbidade administrativa. É o que que suspeita a Promotoria
Agrária, que inclusive já entrou com ação na justiça questionando a forma
violenta com que a WPR se impõe na comunidade do Cajueiro: a empresa colocou no
local uma equipe de segurança contratada da firma Leões Dourados que, segundo
apuração da Delegacia Agrária, teve seu registro de atuação cassado pela
Polícia Federal. Os seguranças da Leões Dourados passaram então a atormentar os
moradores, cerceando o direito de ir e vir, colocando cancelas e portões,
barrando o acesso de pescadores às suas áreas de trabalho, “fichando” os
moradores, entre outras atitudes criminosas. As condutas somente cessaram
depois do protesto da comunidade, bloqueando a BR 135. O promotor Haroldo
Brito, em Audiência Pública realizada pela comunidade, afirmou serem fortes os
indícios de crimes cometidos pela empresa, bem como robustas as suspeitas de
práticas de improbidade administrativa pela Secretaria de Meio Ambiente.
Além da Promotoria Agrária, tramita na justiça maranhense
outra ação, impetrada pela Defensoria Pública do Estado, cujo objetivo é barrar
o licenciamento irregular pretendido pela Sema com a clara intenção de que o
empreendimento seja tocado a todo custo. O defensor Alberto Tavares obteve
êxito na primeira instância, com a suspensão liminar do licenciamento, mas
decisão no Tribunal de Justiça liberou a empresa para prosseguir. A defensoria
anunciou que recorrerá.
As ações da Sema, referendando a atuação da WPR têm lá sua
razão de ser. A ainda governadora Roseana, em 2010, recebeu dinheiro da Suzano
para sua campanha à reeleição. Agora em 2014 não foi diferente: o ex-secretário
da pasta, Victor Mendes, também foi agraciado pela empresa com verba de
campanha. A Wtorre, por sua vez, garantiu uma gorda verba para a campanha da
oposição. Assim, as empresas procuram assegurar seus interesses em qualquer
cenário da política local, seja no continuísmo, seja com a tão propalada “mudança”.
Em reunião com membros da comunidade, o futuro secretário de Articulação
Política tratou de garantir que o novo governo assegurará nova forma de cuidar
dessas questões, ouvindo os verdadeiros interessados, o que incluiria as comunidades.
É o que estas não apenas esperam, como já trataram de assegurar, demonstrando
firmeza e resistência desde já, como nas audiências que vêm realizando no
próprio Cajueiro, com a participação de diversos órgãos (Defensoria Pública,
Delegacia Agrária, Ministério Público, Prefeitura, Câmara, Assembleia, Comissão
Pastoral da Terra, pesquisadores da UFMA, CSP Conlutas, entre outras
instituições) ou participando de outras, como a chamada pelo deputado Bira do
Pindaré, e que aconteceu na Assembleia Legislativa, sem que a WPR tenha se
dignado a participar. Pelo governo, apenas o representante do Iterma (órgão
fundiário) se fez presente, e na sua fala tentou explicar a atuação fundiária
desastrosa do Governo Roseana. Os presentes à Audiência na Assembleia constataram
que havia funcionários da Sema no prédio, mas estes não compareceram,
preferindo acompanhar as discussões em gabinetes de parlamentares amigos, como
suspeitaram os representantes das comunidades e movimentos sociais que
participaram do debate. Nesse dia, como não havia nenhuma autoridade do
Executivo que pudesse falar o porquê de uma atuação tão descolada do interesse
público, as comunidades resolveram se dirigir até a sede administrativa do
Governo, para ouvir explicações dos representantes da Secretaria de
Desenvolvimento, Indústria e Comércio, órgão que é central nessa discussão: a
Sema apenas faz o “jogo” sujo, já que é a Sedinc que, defendendo descaradamente
as empresas, atua para transformar toda a área rural de São Luís nas
proximidades do Itaqui num grande polo industrial, o que poderá, além de fazer
desaparecer dezenas de comunidades centenárias da Ilha, gerar um nível de
poluição que pode comprometer de modo irreversível não apenas os modos de vida
que elas representam, mas o equilíbrio ecológico da capital maranhense.
Em 2010, Roseana Sarney teve entre seus financiadores de campanha a empresa Suzano, que tem interesse na criação de um porto dentro da área da reserva de Tauá-Mirim. Agora, em 2014, o ex-secretário de meio ambiente do governo Roseana, Victor Mendes, também recebeu doações de campanha da Suzano. Enquanto isso, a formalização da reserva ambiental é boicotada, causando um enorme prejuízo a todos que vivem na Ilha de São Luís.
Quem não pode com a
formiga não assanha o formigueiro
O que a associação do poder público com megaempreendimentos
não contava era encontrar habitando a Zona Rural da capital comunidades
difíceis de serem dobradas.
Durante a Audiência na Assembleia, participaram, além
destas, as situadas no município contíguo de Paço do Lumiar, constantemente
ameaçadas pelo avanço da especulação imobiliária. Elas então se juntaram para
denunciar a falta de política fundiária consistente na Ilha, o que, muito longe
de ser apenas a falta de uma política pública, representa o modo de atuação por
excelência do governo do Estado, que privilegia suas conexões com o grande
capital em nome do sacrifício do povo.
A população do Cajueiro, ao se ver “no olho do furacão”,
passou a representar um importante polo de resistência a esse tipo de opressão,
e recebeu apoio das demais que sofrem ataques semelhantes. As outras
comunidades, tanto próximas ao Cajueiro como mesmo as de Paço do Lumiar sabem
que, se não lutarem em defesa da vítima da vez, todas elas continuarão expostas
ao extermínio de que estão ameaçadas pelos grandes projetos e por aqueles que
deveriam zelar por sua segurança e garantir sua sobrevivência. Em razão disso,
após a Audiência na Assembleia, elas foram bater na porta do governo, e
conseguiram arrancar, com a ocupação da Sedinc, uma reunião, que ocorre no
final de novembro, na qual espera-se que, pela primeira vez os órgãos estaduais
finalmente tentem ao menos explicar esse tipo de atuação em benefício de grupos
privados.
Estratégia de Resistência:
A Reserva do Tauá-Mirim
Uma estratégia de resistência das comunidades da Zona Rural
II de São Luís é a transformação daquela área em uma reserva ambiental, a
Reserva Extrativista do Tauá-Mirim, o que pode assegurar a tranquilidade de
quem vive e tira seu sustento da manutenção dos mangues, rios, matas, brejos e
nascentes da área.
O Governo do Estado vem se posicionando de modo ofensivo
contra a criação da chamada Resex Tauá-Mrim, negando-se a emitir seu apoio à
criação, a única peça que falta para que o Instituto Chico Mendes de
Conservação da Biodiversidade, órgão federal responsável pela criação de
unidades de conservação, conclua esse processo. No Maranhão, além de
Tauá-Mirim, outras quatro Resex aguardam o assentimento de Roseana Sarney para
sua criação. A criação da Resex é estratégica para
impedir que a área seja dizimada pelos empreendimentos e que suas populações
desapareçam, afirmam seus defensores: eles vêm chamando a população a também
participar dessa demanda, acompanhando o assunto e assinando o manifesto que
está na Internet sobre a questão (para acompanhar, basta acessar www.facebook.com/resextaua ou www.cajueiroresiste.blogspot.com).
A proposta de criação da Resex,
idealizada pelas comunidades desde os anos 1990, ganhou força entre os anos de
2004 e 2005, no contexto do malfadado polo siderúrgico que estava previsto para
ser implantado em toda aquela área. As comunidades resistiram e conseguiram afastar
essa. Desde então, a criação da Reserva é vista como uma medida definitiva de
se preservar a área, assegurar os direitos dos moradores ao território, e
contribuir para a preservação ambiental.
É esse tipo de atuação coletiva
temida pelos representantes do Governo, que assim não poderiam mais “leiloar” a
área aos seus parceiros industriais. Um exemplo éda própria WPR, que chegou a achacar
moradores, comprando compulsoriamente suas casas no Cajueiro e demolindo-as em
seguida. Em comunidades em que já foi feita a titulação coletiva da área, como
no Taim, posteriormente o próprio governo tentou trocar os títulos de posse e
uso comum da terra por títulos individuais: assim, ficaria mais fácil fazer o
mesmo esquema também nessas localidades.
Durante a Audiência Popular Audiência realizada no
Cajueiro contra o processo atropelado de construção de um porto privado na
área, o professor Horácio Antunes, do Grupo de Estudos: Desenvolvimento,
Modernidade e Meio Ambiente (GEDMMA/UFMA) afirmou que se a Resex Tauá-Mirim já
estivesse criada, a ameaça pela qual aquela o Cajueiro tem passado não estaria
acontecendo. Ele destacou os obstáculos que o atual Governo do Estado sempre
colocou para a criação dessa importante ferramenta de preservação ambiental e
das comunidades nela inseridas. “Está na hora de a gente entrar firme na luta
pela criação da Reserva”, disse. Para ele, o novo governo deve assumir o
compromisso, e “dizer a que veio, e dar a permissão do Governo do Maranhão para
a criação da Reserva Extrativista do Tauá-Mirim”.
Rosana Mesquita, da comunidade do
Taim (da área de criação da Resex), reforça a importância de se lutar pela
criação da Resex. “Eles (as autoridades) já estão falando em combater a elevação
da temperatura em São Luís (recente estudo realizado pela Universidade Estadual
do Maranhão, apresentado em evento da Secretaria Estadual do Meio Ambiente,
chamou atenção para a elevação da temperatura na Ilha). Como que eles vão
combater a elevação da temperatura trazendo esses empreendimentos para cá?”,
questionou.
Para o advogado Rafael Silva, que acompanha, pela
Comissão Pastoral da Terra, a situação de conflito no Cajueiro, a Resex é a
melhor estratégia para defesa de todas as comunidades do entorno, que estão
sendo gradativamente afetadas, com as pessoas sendo expulsas da região pelas
empresas e pelo governo. “Tem que fortalecer essa luta, que é uma luta coletiva
das comunidades da área da Reserva. Essa precisa ser uma pauta inegociável, que
precisa ser levada para esse novo governo, antes mesmo de ele assumir, porque
eu tenho certeza que esses grupos empresariais já estão indo lá fazer suas
gestões junto ao novo governo. Então, temos que fortalecer essa luta”, afirmou.
A área proposta para a Reserva
abrange os povoados Cajueiro, Limoeiro, Porto Grande, Rio dos Cachorros e Taim;
engloba também parte da Vila Maranhão e a Ilha de Tauá-Mirim, ao sul de São
Luís e na qual localizam-se os povoados Amapá, Embaubal, Jacamim, Portinho e
Tauá-Mirim, além de um amplo espelho d’água, totalizando 16.663,55 hectares e
perímetro de 71,21 km.
Porto no Cajueiro: o Estado defendendo interesse privado em detrimento
de (vários) interesses públicos
Afinal de contas, qual seria o interesse do Maranhão em uma
defesa, por parte do governo, tão incisiva na construção de um porto naquela
área? Afinal, um porto de uma estrutura avalizada em mais de oitocentos milhões
de reais pode afetar seriamente os negócios do Porto do Itaqui, porto público
sobre o qual José Sarney arrota todos os domingos em seu jornal ter sido criado
por ele e ser essa estrutura “fundamental” para o Maranhão.
Saulo Costa, assessor da Comissão Pastoral da Terra,
levantou pontos defendidos pela WPR para fazer o seu porto na praia de
Parnauaçu, na comunidade do Cajueiro. Vale lembrar que a WPR é uma empresa cujo
capital é de apenas dez mil reais, e está tendo total apoio do Estado que, não
questionando sua competência, lança-se de maneira agressiva num empreendimento
milhares de vezes mais caro que aquilo que ela diz valer.
Saulo Costa, analisando o Relatório de Impacto Ambiental no
qual a empresa atesta a viabilidade do empreendimento, disse, durante a
Audiência Popular realizada pela comunidade no Cajueiro: “Nesses documentos, a
empresa assume que há inúmeros impactos para a área, mas que todo esse
sacrifício socioambiental pode ser recompensado com a implantação do projeto,
já que o Terminal Portuário traria desenvolvimento para a região”.
É de se questionar, entretanto, que desenvolvimento seria
esse, bem como a quem ele serviria. Foi o que fez Alberto Cantanhede, o Beto do
Taim, durante a Audiência na Assembleia. Ele foi enfático: “"Porto no Parnauaçu não é interesse do Estado, é privado.
E vai fazer concorrência com o próprio Porto do Itaqui, que é nosso! O que nós precisamos é nos manter unidos. Não é o Estado
negando a Carta de Apoio para a criação da reserva Extrativista do Tauá-Mirim
que nós vamos ficar acomodados. Nós sabemos que a criação da Reserva não
resolve todos os nossos problemas, mas já resolve um deles, que é a questão do
território. Não estamos solicitando a criação da Reserva
Extrativista do Tauá-Mirim por uma questão de privilégio, mas chamando para nós
a responsabilidade de cuidar daquele patrimônio. Nós sempre tivemos essa
responsabilidade, mas, diante de tantos riscos, é preciso demarcar e
titular", disse Beto.
Audiência realizada em novembro, na Assembleia Legislativa, discutiu a violência bancada pelos aliados da Suzano na área da reserva Extrativista de Tauá-Mirim (na comunidade do Cajueiro). As comunidades estiveram presentes. O governo e as empresas boicotaram.
Questão fundiária: um problema não resolvido pelo Estado com a intenção
de lucrar com o sacrifício alheio
As empresas que pleiteiam se instalar no local contam com
uma lacuna deixada, pelo que parece de modo deliberado, pelo Estado. É que, com
a falta de titulação de comunidades que habitam a área há muito tempo, qualquer
um que chegue e se apresente como proprietário consegue negociar com o Estado e
com as empresas, para quem vendem as áreas com a conivência do Estado,
legitimando papeis emitidos ou reconhecidos em cartório mas que transpiram
suspeitas.
É o caso do Cajueiro, que teria sido titulado pela própria
governadora em 1998, ainda que em 2011 ela mesma mande desapropriar a área, por
“interesse público”, em nome da Suzano. A WPR, por sua vez, alega ter comprado
a área de Carlos Cunha, empresário, sócio da BC3 Multimodal, empresa que atua
na área vendendo terrenos e que, no contrato com a WPR, teria prioridade em
operar o porto a ser construído por esse braço da WTorre. Carlos Cunha aparece
em ações na justiça que versam sobre vendas de terrenos. Numa delas, sua
atuação é classificada por uma compradora como golpe, já que, depois de ter
vendido um lote avaliado em pouco mais de 2 milhões para essa compradora,
tornara a vender a mesma área para uma outra empresa, agora não em seu nome,
mas em nome da BC3 (o comprador seria um grupo espanhol que pretende investir
no Maranhão, segundo informações da Secretaria de Indústria e Comércio). Mesmo
com esses indícios, Carlos Cunha obteve êxito, com extinção do processo, nesse
caso específico, em razão de acordo com a primeira compradora. Os moradores de
várias áreas da Zona Rural relatam casos de grilagem que teriam sido praticados
pelo empresário, que agora teria vendido toda a área do Cajueiro para a WPR.
Como se vê, é uma história no mínimo mal contada e cujo fio
da meada é difícil de se acompanhar, o que não gera nenhum tipo de
questionamento por parte do Estado que, referendando conexões tão controversas,
prefere atropelar comunidades e acreditar, de olhos fechados, num negócio tão
nebuloso, pondo-se a atuar para garantir que seus parceiros não tenham seus
interesses contrariados. Mas mesmo lutando contra agentes tão influentes e
poderosos, as comunidades seguem unidas, lutando para que o capítulo da
História do Maranhão que está sob suas responsabilidades, este sim, não seja
apagado, riscado do mapa, e deixado se der contado aos seus descendentes e a
toda a Ilha de São Luís.
Audiência
pública discutirá os graves conflitos fundiários e ambientais que ocorrem na
Comunidade do Cajueiro, em São Luís
No próximo dia 19/11 (quarta-feira), às 14h, a Comissão de Defesa dos Direitos Humanos
e Minorias da Assembleia Legislativa do Estado do Maranhão realizará, no
auditório da casa, audiência pública para discutir os graves conflitos territoriais e ambientais constatados a partir do
licenciamento ambiental de um terminal portuário na área do Parnauaçu,
Comunidade do Cajueiro, sudoeste da Ilha do Maranhão, em São Luís. Na
audiência, estarão presentes representantes das comunidades, da Assembleia
Legislativa, Câmara dos Vereadores de São Luís, Ministério Público Estadual,
Ministério Público Federal, Secretarias de Estado do Maranhão, Delegacia de Crimes Agrários, associações da
sociedade civil e movimentos sociais.
Desde junho
deste ano, empresa empreendedora, WPR São Luís Gestão de Portos e Terminais Ltda,, por intermédio da
consultoria ambiental Urbaniza Engenharia, apresenta-se como proprietária empreendedora
da Comunidade Cajueiro, promovendo graves
atos de violência, fraude e intimidação contra aos comunitários e moradores
tradicionais da área. A empresa Urbaniza apresentava-se como a responsável por
fomentar benefícios do Estado para moradores, levantava dados documentais das
famílias, obtinha procurações por meio das quais realizava compras a preços
irrisórios, com ameaça e intimidação, alegando que a venda seria o último
recurso para que os moradores não fossem expulsos pelo Estado, sem qualquer
indenização.
Para
agravar a
situação, e mesmo sem qualquer licença ambiental, a empresa WPR mantinha
uma milícia
armada na área para facilitar a sua imediata instalação. Entre outras
ações, os
seguranças dessa milícia ameaçavam e agrediam os moradores, plaqueavam e
numeravam as paredes das casas como se fosse de propriedade da empresa,
demoliam as casas compradas fraudulentamente, proibiam o acesso dos
pescadores
à praia, proibiam roças e construções, alteravam o limite de cercas,
constrangiam, de diversas formas as famílias. As comunidades, que
possuem
direitos possessórios legítimos e conferidos por título do Estado,
permanecem
sendo tratadas como invasoras. São comunidades interdependentes de
pescadores, agricultores familiares, catadores de caranguejo, mariscos e
outros produtos extrativistas, que possuem estreita relação com o
ambiente e a terra onde vivem.
Por sua vez, o licenciamento ambiental
do terminal portuário, que era realizado pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente
e Recursos Naturais do Maranhão – SEMA -, apresenta graves indícios de ilegalidade, suspeição, abuso de poder, falta de
transparência, ocultação e inconsistência de estudos socioambientais. A
própria legitimidade da empresa WPR, que se apresenta como empreendedora desse terminal
portuário de 800 milhões de reais, vem sendo questionada e está sob
investigação.
Esses atos da empresa, reforçados
pelo governo do Estado do Maranhão, são objetos de ações civis públicas e
inquéritos civis, tendo culminado, recentemente, na suspensão do licenciamento
ambiental. Todavia, os problemas
permanecem no cotidiano dessas comunidades e as mesmas ameaças se alastram por
comunidades adjacentes, como Vila Maranhão, Mãe Chica, Camboa dos Frades...
Coincidências de procedimentos de fraude e intimidação, indícios de grilagem,
violência física e atentado a direitos possessórios são narrados envolvendo,
muitas vezes, atores em comum.
Inúmeros atentados contra centenas de
famílias, que ocupam essas áreas por décadas e ancestralmente, estão sendo
agravados nas últimas semanas. A audiência pública desta quarta-feira será uma
valiosa oportunidade para trazer ao público e às autoridades informações sobre
o caso, para a adoção de medidas urgentes na defesa dessas comunidades e imediata
investigação.
Divulgue e
participe!
Audiência pública sobre os conflitos
fundiários e ambientais da Comunidade do Cajueiro, em São Luís
Quando: 19/11/2014, às 14h
Onde: Auditório da Assembleia Legislativa
do Estado do Maranhão
É passada a hora de nos envolvermos profundamente com uma causa ambiental de resultados, cujas consequências dizem respeito não apenas aos diretamente afetados pela criação da Resex Tauá-Mirim, mas a todos os habitantes da capital maranhense: a criação da Reserva Extrativista do Tauá-Mirim, unidade de conservação ambiental a ser criada na Zona Rural da cidade, atinge mais de uma dezena de comunidades na chamada Zona Rural II de São Luís, conservando-lhes o território para que desenvolvam com tranquilidade suas atividades, que estão relacionadas à pesca, agricultura e criação de pequenos animais. É dali que aproximadamente quinze mil pessoas tiram diariamente seu sustento, bem como contribuem para a segurança alimentar da cidade, através da comercialização de seus produtos nas feiras da capital. A questão é que todo esse contingente populacional, que em grande parte habita aquela região há mais de um século, vive constantemente ameaçada pelo avanço das indústrias poluentes na região. Em nome do benefício de alguns poucos, o Estado tem servido para atender a interesses privados, sob um discurso que, depois de expulsas as famílias, não se confirma: criação de emprego e renda, melhora da qualidade de vida são desculpas que têm servido para ameaçar a segurança de um grande número de famílias que, após cederem seus territórios, muitas vezes sem a mínima oportunidade de contestar seu inevitável deslocamento, não veem concretizadas suas esperanças, e vão parar nas periferias, aumentando a demanda por serviços públicos já, há muito precários. Além disso, os prejuízos ambientais com o avanço sobre a região são incomensuráveis: destruição de manguezais, matas, brejos e nascentes, que há muito tempo são utilizadas pelas comunidades para desenvolverem suas atividades de modo sustentável, contribuindo para sua conservação. Todo esse rico ecossistema está ameaçado caso essas comunidades desapareçam daquela área! A criação da Resex é, portanto, uma demanda de toda a São Luís, por mais qualidade de vida, por um meio ambiente saudável, e por tranquilidade a inúmeros de seus filhos que habitam a região. Em razão disso tudo, conclamamos a todos a não apenas assinar a petição, o que pode ser feito agora, através de computador, smartphone ou tablet, ou ainda imprimindo a folha de assinaturas e coletando apoiadores para fortalecer esse movimento. Ajude a construir essa história, fazendo parte dela, pressionando as autoridades para que, depois de quase vinte anos que as comunidades da Zona Rural da cidade clamam pela criação da reserva ambiental, possam ser finalmente ouvidas e dormirem tranquilas, sabendo que no dia seguinte não estarão ameaçadas de serem retiradas de suas casas, que poderão pescar e plantar e continuar a fazer o que sempre fizeram, e que muito contribui para que tenhamos uma cidade mais humana!
Ajude a coletar as assinaturas! Após preenchidas, as folhas podem ser entregues na sede da Comissão Pastoral da Terra, no Centro (Rua do Sol, 457); na Sala do GEDMMA, na UFMA (Centro de Ciências Humanas, CCH, Bloco 1, Térreo) e nas Uniões de Moradores do Cajueiro, do Taim e de Rio dos Cachorros, na Zona Rural de São Luís!
Durante a Audiência popular realizada na sede da União de Moradores do Cajueiro, em São Luís, o deputado Bira do Pindaré chamou a todos a participarem da Audiência convocada pela
Comissão de Direitos Humanos da Assembleia para discutir a situação da comunidade. Será dia 19
de novembro, às 14h30, na Sede da Assembleia Legislativa do Maranhão, no Rangedor/Calhau. Na ocasião, foi solicitado ao deputado que ele convide para
a Audiência os membros do secretariado do governador eleito.
Durante encontro com o futuro secretário da Articulação Política do Governo do Maranhão, o PadreClemir, da Comissão Pastoral da Terra, ressaltou a importância dessa Audiência Pública, tanto para tratar da questão do
Cajueiro e os ataques sofridos pela comunidade, bem como, consequentemente, da importância da criação da Resex de Tauá-Mirim. Ainda sobre a audiência, durante esse encontro com o representante do governo eleito a vereadora Rose
Sales falou da importância de participação das pastas que serão decisórias
nesse processo, e reiterou o pedido para que o futuro secretário solicite aos demais membros
já anunciados do novo governo que estejam presentes (entre estes, o secretário
de Portos, o de Direitos Humanos e Participação Popular, bem como os que vierem
a ser confirmados, como Meio Ambiente, Indústria e Comércio, Cidades, e de
órgãos estaduais como Iterma - Instituto de Terras - e o presidente do Porto do
Itaqui, entre outros).
A sociedade também deve participar de forma ativa desse processo, no qual se discute uma política ambiental decisiva para a cidade de São Luís, bem como as garantias de direitos das nossas comunidades, constantemente ameaçadas por empreendimentos que, em conluio com autoridades, fazem desaparecer, a cada dia, uma comunidade da Ilha e, com ela, uma parte de nossa história.
No dia 4 de novembro, foi realizada reunião
entre o futuro secretário estadual de Articulação Política e Assuntos
Federativos, Márcio Jerry; Sr. Davi, Dona Nicinha, José da Silva (Seu Batata) e
Wilson, membros da comunidade do Cajueiro, ameaçada pela possibilidade de construção
de um complexo portuário pela empresa WPR na área; vereadora Rose Sales;
Padre Clemir, Saulo Costa e Rafael Silva, representantes da Comissão Pastoral
da Terra; Saulo Arcangeli, da CSP Conlutas; Beto do Taim - comunidade da área
da Reserva Extrativista do Tauá-Mirim; Kátia Barros, do Instituto Chico Mendes
de Conservação da Biodiversidade/ ICMBio, órgão do governo federal; Viviane Vazzi,
Bartolomeu Mendonça e Horácio Antunes, do Grupo de Estudos: Desenvolvimento, Modernidade e Meio Ambiente/GEDMMA, vinculado aos programas de pós-graduação em
Ciências Sociais e em Políticas Públicas da Universidade Federal do Maranhão.
O objetivo do encontro foi informar sobre a
situação do Cajueiro, com as ameaças sofridas desde
que "seguranças" colocados pela WPR apareceram no
bairro, impondo terror e restringindo o direito de ir e vir dos moradores
dentro da própria comunidade. Tudo isso com a cumplicidade dos atuais
ocupantes do governo estadual, que chegaram inclusive a forjar uma audiência
pública no Comando Geral da Polícia Militar do Estado para que a empresa seguisse com o empreendimento.
O Sr. Davi (presidente da União de Moradores) informou ao futuro secretário (um dos
principais nomes do governo que assume a partir de janeiro) que os seguranças
da empresa Leões Dourados, embora não desfiram mais ameaças diretas aos
moradores, continuam na área, ressaltando que a presença deles prossegue
representando uma ameaça. Segundo informações do delegado
agrário, Carlos Augusto, a Leões Dourados atua de forma irregular, segundo lhe teria sido informado
pela Polícia Federal. O presidente da União de Moradores disse querer
saber de Márcio Jerry se o novo governo vai estar nessa luta ao lado do
Cajueiro, já que agora está sabendo do que a comunidade tem passado.
Davi, presidente da Associação dos Moradores do Cajueiro, fala sobre as ameaças vividas pela comunidade
O senhor José da Silva, por sua vez, reafirmou ante o
secretário o que dissera na Audiência Popular realizada pela comunidade na
União de Moradores: que hoje tendo 58 anos, nasceu no Cajueiro, e que o
lugar se encontra ameaçado. Segundo ele, todos os povoados da região estão na mesma situação de insegurança. "O foco no momento é o Cajueiro, onde apareceu
esse cidadão (que teria vendido a área para a WPR) que andava com seguranças,
negociando e riscando as casas (marcando-as). Na minha, botaram o número '45'.
Entravam e fotografavam os quintais. Entravam achando que ali só tem bobo e analfabeto.
Passaram tempos chegando lá de helicóptero, de onde filmavam tudo. E agora
chegaram lá expulsando os moradores de suas próprias casas. Depois ameaçaram, com
mais de 40 homens, e com arma de fogo. Com nossa manifestação obstruindo a BR,
a Polícia Federal foi e prendeu 4 dos que estavam lá, com facões e armas de
fogo. Esse cidadão chegou dizendo que estava no direito dele, mas os donos
somos nós, que nascemos lá. (Foi) uma falta de respeito", desabafou.
Beto do Taim: "A situação lá é
política" Para Beto do Taim, "a situação lá é
muito mais política". Ele explicou: "Temos um título de posse, de
1998, dado pelo Estado. Alguns não passaram pelo cartório. Na nossa comunidade
do Taim tivemos esse cuidado. Aí, quando chega em 2011, o mesmo governo que nos
deu o título manda desapropriar a terra (em benefício da Suzano Papel e
Celulose). A Unidade de Conservação da Resex do Tauá-Mirim, no nosso ponto de
vista, resolveria essa parte da questão. Me parece que é isso que as pessoas
que estão hoje no Governo do Estado estão querendo evitar", explicou.
Beto disse ainda que a criação da Resex está
justamente parada em razão de uma carta: não há exatamente uma lei, mas
uma determinação do Governo Federal de que sejam ouvidos os governos dos estados onde há áreas de reservas
ambientais em vias de criação. E o Governo do Estado, até agora, vem emitindo sinais de que não
pretender ver a Resex criada, tendo inclusive manifestado isso em
correspondência ao Executivo Federal.
Beto fez um apelo para que o governo que
assumirá a partir do ano que vem resolva a situação, e dê tranquilidade às
famílias que habitam e vivem da área de criação da Resex do Tauá-Mirim.
Segundo ele, uma das preocupações - que
inclusive ganharam destaque este ano em razão da crise no estado de São Paulo -
recaem sobre os recursos hídricos, abundantes na região, e que
estão vulneráveis com o avanço desmedido dos grandes projetos na área, sem controle algum (o discurso do desenvolvimento é acionado nesse momento,
bem como o da geração de empregos, que não se confirmam no momento posterior à
implantação dos projetos, pelo menos não na mesma quantidade e qualidade com as quais são
anunciados). Beto solicitou que o novo governador, ao assumir, manifeste ao
Governo Federal sua concordância com a criação da Reserva.
A liderança comunitária destacou ainda
contrariedade com o discurso oficial acionado para justificar o avanço de
empreendimentos poluentes na região e o consequente deslocamento de populações
da área: "Não é que na região não haja um setor econômico. Lá tem
economia, mas precisamos que seja dada tranquilidade, até para podermos nos
organizar, o que pode ser feito com a criação da Reserva". Ele destacou
várias possibilidades que a criação da Unidade de Conservação pode proporcionar
para seus habitantes, como o acesso a linhas de crédito para o fomento da
pesca e da agricultura desenvolvidas pelas comunidades.
O que está dito e o que não está dito
no projeto do porto da WPR no Cajueiro
Durante a reunião com o futuro secretário de
Articulação Política, Saulo Costa, da CPT, destacou a série de dificuldades
acionadas pela Secretaria Estadual do Meio Ambiente para não atender ao
requisito da transparência, que devia ser um imperativo nesse caso: o fato de
se realizar uma audiência pública na Polícia; e os obstáculos para se conseguir
acesso às informações sobre o caso, com as várias idas de instituições como a
CPT e de membros da comunidade à Sema para que se pudesse obter detalhes sobre o projeto e seus reais impactos, que
deveriam ser públicos.
Segundo Saulo Costa, uma das omissões diz
respeito ao que se refere realmente o empreendimento e que não consta nos
relatórios e estudos de impactos ambientais (EIA/RIMA): "O projeto em
questão se refere a porto e retroporto (área próxima ao local de operação pelo
empreendimento, que também é afetada e utilizada por este). No EIA/RIMA consta
como se fosse um único empreendimento mas, quando você vai ver, são dois
(porto, retroporto). Eles não podem, de maneira alguma, ludibriar a
sociedade", disse.
Saulo anotou ainda que seriam basicamente
três tipos de commodities previstas para serem movimentadas no
pretendido terminal portuário: celulose (que atende à empresa Suzano),
combustíveis (Petrobras e possivelmente a refinaria do Maranhão, se algum dia
ficar pronta), e grãos (atendendo a empresas do agronegócio, como a Bunge).
Segundo ele, esses produtos podem ter vazão por outros portos já existentes,
como é o caso do Itaqui. Portanto, insistir num empreendimento social e
ambientalmente nocivo, pode ainda contribuir para enfraquecer o principal porto
público do Estado, em favor de um empreendimento privado.
Ele destacou também outra questão que não
aparece no EIA/RIMA, que diz respeito ao assoreamento do mar na região, cuja
dimensão da dragagem e do impacto que iria causar não aparece como deveria nos
relatórios. "O que a gente quer colocar para o novo governo é: afinal de
contas, para quem é esse porto? Um porto privado, que vai atender ao capital privado,
de forma unilateral. O Porto do Itaqui perde investimentos com a construção de
um porto privado, além dos impactos que ameaçam as comunidades". Saulo
Costa lembrou ainda a ameaça representada ao Terreiro do Egito, um dos primeiros locais
de culto afro no Maranhão, que pode sofrer impacto direto e irreversível com o
empreendimento, afetando assim parte da História maranhense. "O EIA/RIMA
em nenhum momento coloca isso. Não coloca essas questões para a sociedade: é
interessante para o Estado? Por que essa pressa, afinal?".
Decisão judicial favorável à
comunidade: um passo à frente na luta Horácio Antunes, do GEDMMA, também chamou
atenção para a série de medidas apressadas tomadas pela empresa e pela Sema e à
série de ações de resistência a que a comunidade teve de realizar. Para ele, a
impressão que fica com esses atos atropelados da Secretaria de Estado e do empreendedor é que o projeto tem de sair de qualquer jeito. Horácio citou ainda a concessão da liminar na
justiça suspendendo o licenciamento ambiental e o avanço do
projeto. A decisão judicial favorável à comunidade foi solicitada pela
Defensoria Pública do Estado.
Além da decisão judicial,
reconhecimento da área como pertencente à Reserva Extrativista do Tauá-Mirim
foi mais um avanço na luta da comunidade O advogado Rafael Silva, por sua vez,
destacou o ato público realizado pela comunidade em frente à Secretaria do Meio
Ambiente, na tarde da segunda-feira, dia 3 de novembro, quando os moradores
foram entregar requerimento solicitando a suspensão do licenciamento. Vendo que a comunidade estava determinada a
ser atendida, o secretário-adjunto deu sua palavra que, se ficasse
comprovado que a área estava dentro do território previsto para a criação
da Resex Tauá-Mirim, suspenderia o licenciamento. Segundo os presentes, o
adjunto da Sema tinha plena convicção de que a área pretendida pela WPR não
fazia parte da área da Resex. Ele não contava, entretanto, que a comunidade
tinha como provar o que estava afirmando (que a área pertence ao território da
Resex e que por isso não pode, segundo decisão da Justiça Federal, ser objeto
de empreendimentos que lhe causem grandes impactos): o ICMBio já havia emitido
laudo segundo o qual a área afetada pelo projeto está sobreposta à área da
Resex. O laudo, inclusive, já fora apresentado à Procuradoria da República no Maranhão, para que acompanhe o caso.
Rafael Silva ressaltou que todo esse caso
demonstra como o Estado atuou, através das secretarias de Meio Ambiente e de
Indústria e Comércio, segundo os interesses de um empreendimento privado, mesmo
quando esses se chocaram de modo grave contra o interesse público, chegando a ser
cúmplice das tentativas de coação e de fragmentação de uma comunidade. O que
transparece, no caso, é uma cultura consolidada de a Secretaria de Meio
Ambiente ser subordinada aos projetos de interesse da Secretaria de Indústria e Comércio.
"Isso é uma coisa que a nova gestão precisa demarcar: uma diferença muito
clara em relação a esse modelo. É importante para Estado que a Sema tenha
a importância que merece, e que não tem tido atualmente. Precisamos saber, com
maior clareza, qual o entendimento do governador Flávio Dino sobre a Resex e
sobre o licenciamento desse projeto. Estamos numa situação de insegurança em
relação a essas questões, e por isso queremos abrir o diálogo com o novo
governo", disse.
Rafael Silva: Precisamos saber, com
maior clareza, qual o entendimento do governador Flávio Dino sobre a Resex e
sobre o licenciamento desse projeto
Kátia Barros, do CNPT, órgão do
Governo Federal que atua junto às comunidades tradicionais: "A Resex de
Tauá-Mirim é uma estratégia das comunidades para a defesa da região"
A coordenadora do CNPT (Centro
Nacional de Pesquisa e Conservação da Sociobiodiverdidade) fez um histórico do
processo de criação da Resex, proposta que aguarda, até hoje, pela decisão dos
governos estadual e federal. Segundo ela, é sabido que o governo estadual tem
interesses na área, mas esses não podem se contrapor aos interesses das
comunidades que lá habitam há muito tempo. Ela informou que o perímetro destinado à
criação da Resex já foi negociado pelos ministérios do Meio Ambiente e das
Minas e Energia, juntamente com as comunidade e o Governo do Estado. Ela reafirmou a sobreposição do projeto da WPR em relação à Reserva. Kátia informou ainda que a informação sobre a sobreposição de área somente foi solicitada pela Sema ao ICMBio duas horas antes do início da audiência realizada na Polícia. Ela confirmou as informações dadas por Saulo Costa, de que o EIA/RIMA do
empreendimento realmente não faz uma avaliação profunda de impacto sobre o ecossistema, chamando
atenção para a questão do Terreiro do Egito, cuja história remonta a 1820, e
que pode ser drasticamente afetado caso tudo seja aprovado da forma que está. Segundo ela, essa é uma questão que
passa pela problemática fundiária no local.
Kátia Barros: a Resex é uma demanda das comunidades para defender seus territórios
Sobre a questão fundiária, Padre Clemir, da CPT,
lembrou que pelo terceiro ano consecutivo o Maranhão lidera o número de
conflitos no campo no Brasil, com destaque para o emprego de milícia armada
pelos pretensos donos das áreas ocupadas por camponeses e populações
tradicionais em geral. "A expectativa é que o governo que chega tenha
outra postura, porque o que hoje é visto é o Estado usando o próprio Estado
(polícia e justiça) contra as pessoas", disse Padre Clemir.
AUDIÊNCIA -O PadreClemir destacou a importância da Audiência Pública que
acontecerá dia 19 de novembro, a partir das 14h30, na Assembleia Legislativa do Maranhão, para tratar da questão do
Cajueiro e os ataques sofridos pela comunidade, bem como, consequentemente, da importância da Resex de Tauá-Mirim.
Sobre a referida audiência, a vereadora Rose
Sales falou da importância de participação das pastas que serão decisórias
nesse processo, solicitando que o futuro secretário solicite aos demais membros
já anunciados do novo governo que estejam presentes (entre estes, o secretário
de Portos, o de Direitos Humanos e Participação Popular, bem como os que vierem
a ser confirmados, como Meio Ambiente, Indústria e Comércio, Cidades, e de
órgãos estaduais como Iterma - Instituto de Terras - e o presidente do Porto do
Itaqui, entre outros).
Por uma política portuária que
privilegie o interesse público Bartolomeu Mendonça destacou que somente após
a forçada audiência pública na Polícia soube-se que, por trás da WPR, estava a
gigante WTorre, empresa nacional do ramo de engenharia. Segundo ele, é importante pensar a política
portuária do Maranhão, que vem pretendendo privilegiar portos privados, como
acontece agora no caso WPR versus Comunidade do Cajueiro. Para ele, o novo governo tem a oportunidade
de corrigir uma injustiça histórica dando atenção aos portos comunitários existentes na região e apoiando a criação da Resex do Tauá-Mirim,
que vem sendo debatida pelas comunidades desde 1996.
Sobre a criação da Reserva, Saulo Arcangeli,
da CSP Conlutas, disse que aguarda a participação do futuro governo na
Audiência Pública a ser realizada na Assembleia Legislativa. Ele afirmou que a Central Sindical
e Popular vai cobrar do novo governo um posicionamento sobre a Reserva que, em seu
entender, é um importante instrumento para tirar as comunidades da área de uma
posição defensiva em relação aos ataques que sofrem constantemente.
Como uma empresa cujo capital é de
dez mil reais pretende construir um porto avaliado em 840 milhões? Os participantes da reunião comunicaram ainda
a Márcio Jerry que estranham o fato de o capital social da WPR ser de dez mil
reais, incompatível com a construção de um empreendimento dessa dimensão, avaliado em mais de oitocentos milhões de reais.
Outra preocupação apontada pelos presentes à reunião foi em relação às constantes ameaças de deslocamento populacional, o que impactaria de forma direta também as periferias urbanas de São Luís, que já padecem de falta de estrutura. Vivem na área cerca de quinze mil pessoas, constantemente ameaçadas de expulsão pelos empreendimentos públicos e privados que avançam sobre a região.
Primeiras palavras do governo eleito
sobre a situação do Cajueiro e sobre a criação da Resex
O futuro secretário agradeceu a oportunidade
de tomar conhecimento das questões levantadas pelos presentes. Ele avaliou que,
no momento, não tinha como dar resposta definitiva sobre os assuntos abordados,
mas que seriam levados para o governador eleito avaliar. Jerry disse ser impossível garantir que
conflitos não venham continuar a existir, mas que o compromisso do novo governo
é de uma mudança de atitude em relação a eles. "Há que se garantir e
preservar direitos. É o que se vai buscar fazer", assegurou.
Márcio Jerry: direitos serão respeitados
O futuro secretário do Governo Dino disse que
são importantes as garantias pelas quais a comunidade procurou se cercar,
com mobilização dos moradores em torno do assunto, a busca do diálogo, como
estava acontecendo com essa reunião, e os instrumentos de proteção legal, como
a decisão conseguida pela Defensoria Pública em favor da comunidade.
A reunião encerrou-se com o secretário reafirmando
a disposição para o diálogo, o que, segundo ele, demarca uma diferença em
relação ao governo atual. Para Márcio Jerry, a questão será levada ao
governador eleito, e a postura adotada será diferente, no sentido de se
procurar preservar direitos e de não se privilegiar um interlocutor em
detrimento de outros: "A postura do governador, posso dizer, será a de
preservar e respeitar direitos, sem assimetria de atuação do Estado, sem
privilégio a uns interlocutores, deixando outros de lado", afirmou.
Vitória da luta do Cajueiro e das comunidades da área da Resex de Tauá-Mirim! Nesta terça-feira, dia 4 de novembro, saiu a liminar da justiça, emitida pela Vara de Interesses Difusos e Coletivos que, atendendo a solicitação da Defensoria Pública, na pessoa do defensor Alberto Tavares, suspendeu o pretendido licenciamento ambiental para a construção do porto da WPR na área do Cajueiro. A comunidade vem lutando intensamente contra as irregularidades no processo de licenciamento, e contra todas as investidas violentas da empresa, sob o silêncio do cúmplice do atual governo do Estado. Ainda na segunda-feira, após intensa mobilização na sede da Secretaria Estadual do Meio Ambiente, a comunidade conseguiu entrar com pedido, naquela secretaria, para suspensão do processo de licenciamento. Na ocasião, foi entregue ao secretário-adjunto documento emitido pelo ICMBio, órgão do governo federal, comprovando que boa parte da área pretendida pela WPR fica dentro da área em que se pleiteia a criação da Reserva Extrativista do Tauá-Mirim. Decisão da Justiça Federal já havia determinado que todo empreendimento planejado para a área da Resex Tauá-Mirim não pode avançar sem que antes se chegue a uma decisão sobre a Reserva. Já na terça, outro pedido de suspensão, esse feito pela Defensoria Pública diretamente na justiça, obteve sucesso, com a concessão da liminar, bastante fundamentada.
Veja, na íntegra, a decisão do juiz Douglas de Melo Martins: AÇÃO CAUTELAR 46221-97.2014.8.10.0001 (494772014) REQUERENTE: DEFENSORIA
PÚBLICA DO ESTADO DO MARANHÃO DEFENSOR: Alberto Guilherme Tavares de
Araújo e Silva REQUERIDO 1: ESTADO DO MARANHÃO Endereço Av. Euclides
Figueiredo, s/n, Ed. Nagib Haickel, 3º andar, Calhau REQUERIDO 2: WPR
SÃO LUÍS GESTÃO DE PORTOS E TERMINAIS LTDA ADVOGADO MA8372 - Adolfo
Silva Fonseca DECISÃO CONCESSIVA DE MEDIDA LIMINAR RELATÓRIO Trata-se de
pedido de liminar formulado por DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO
MARANHÃO contra ESTADO DO MARANHÃO no qual requer seja determinado ao
requerido que: i) Abstenha-se de dar seguimento ao processo
licenciatório do Terminal Portuário de São Luís - WPR (Processo SEMA n.
108205/2014), até o julgamento da presente ação. Afirma a autora que a
WPR SÃO LUIS GESTAO DE PORTOS E TERMINAIS LTDA pretende implantar
terminal portuário no Distrito Industrial de São Luís, mais precisamente
na região em que hoje resta assentada a comunidade tradicional do
Cajueiro. Informa que a comunidade do Cajueiro se acha regularmente
assentada na área, pelo Estado do Maranhão, desde 1998, conforme
escritura pública condominial registrada junto ao 2º Cartório de
Registro de Imóveis de São Luís. Refere, ainda, que a região é objeto de
procedimento administrativo que visa a criação de uma reserva
extrativista (Resex Tauá-mirim). Afirma que o empreendimento do terminal
portuário se encontra em fase de aprovação de licença prévia pelo
Estado do Maranhão, por meio da SEMA. Informa, ainda, que não consta de
pedido de licenciamento perante o IBAMA, conforme documento de fl. 202.
Requer a concessão de medida liminar no sentido de que seja suspenso o
processo licenciatório para a instalação do terminal portuário, tendo em
vista os princípios da legalidade e da prevenção. Às fls. 213/217 foi
concedida, em parte, a liminar requerida contra a WPR SÃO LUÍS GESTÃO DE
PORTOS E TERMINAIS LTDA. Devidamente intimado para se manifestar em 72
horas, o Estado do Maranhão silenciou quanto ao pedido de liminar contra
si formulado. Às fls. 229/231, a autora requer a apreciação do pedido
de liminar contra o Estado do Maranhão e, na oportunidade, junta aos
autos recortes de matérias jornalísticas sobre a instabilidade na área
da comunidade do Cajueiro. A requerida WPR SÃO LUÍS GESTÃO DE PORTOS E
TERMINAIS LTDA juntou aos autos, às fls. 233/243, cópia do recurso de
Agravo de Instrumento interposto contra a decisão de fls. 213/217. Às
fls. 245/279, a Defensoria Pública junta documentos. É o relatório. FUNDAMENTAÇÃO O processo cautelar, de cunho instrumental, tem o condão
de possibilitar ao titular da pretensão a tutela que resguarde o seu
direito contra eventual ofensa iminente, que possa lhe causar lesão
irremediável ou de difícil reparação, de tal sorte que o emprego de
outras formas de atividade jurisdicional provavelmente não se revelaria
eficaz, seja para impedir a consumação da ofensa, seja mesmo para
repará-la de modo satisfatório. Barbosa Moreira, explicando o caráter
urgente das medidas cautelares, acentua que não é possível investigar,
previamente, de maneira completa, a real concorrência dos pressupostos
que autorizariam o órgão judicial a dispensar ao interessado a tutela
satisfativa: ele tem de contentar-se com uma averiguação superficial e
provisória, e deve conceder a medida pleiteada desde que os resultados
dessa pesquisa lhe permitam formular um juízo de probabilidade acerca da
existência do direito alegado, a par da convicção de que, na falta do
pronto socorro, ele sofreria lesão irremediável ou de difícil reparação.
(MOREIRA, 2010, p. 309) Nesta decisão, a análise cinge-se ao pedido
formulado contra o Estado do Maranhão, vez que na decisão de fls.
213/217 foi apreciado o pedido formulado contra a WPR SÃO LUÍS GESTÃO DE
PORTOS E TERMINAIS LTDA. Encontro-me diante da seguinte situação: de um
lado uma comunidade humilde que, há quase cem anos, habita uma área
regularmente assentada, da qual retiram todo o seu sustento por meio de
trabalho digno e conservam sem modo tradicional de viver. De outro, de
forma não menos digna, mas em posições totalmente contrárias, o Estado
do Maranhão e a WPR São Luís Gestão de Portos Ltda. A lide não se
circunscreve apenas a questões atreladas ao domínio da localidade
denominada Cajueiro. Em sentido contrário, diz respeito à remoção de
dezenas de famílias de um local que há anos habitam e desenvolvem suas
atividades de subsistência. Ainda que o cerne da questão fosse a posse
do local, em uma análise liminar, assistiria razão à Defensoria Pública,
visto que ficou comprovado nos autos a regularidade do assentamento e o
justo título com registro no Cartório de Imóveis (fls. 30/31). A
requerida WPR, no bojo do recurso de Agravo, fundamentou sua pretensão
no domínio da área, fazendo alusão a um suposto título de propriedade
que aduz possuir. Admitindo-se a existência do aludido título, a posse
da área militaria, ainda assim, em favor dos assistidos pela Defensoria
Pública, fator este que contribui, inclusive, para a manutenção da
decisão recorrida. Ademais, o deslocamento de um grande número de
famílias (750 de acordo com o Estudo de Impacto Ambiental - fl. 246) de
forma involuntária para instalação de empreendimento portuário, sem a
complementação de medidas atenuantes, pode ocasionar diversos problemas
de ordem socioeconômica, dentre os quais o empobrecimento pela perda do
patrimônio ou fonte de renda, a desagregação dos sistemas de produção,
realocação de pessoas para localidades onde sua capacidade de produção
pode ser menos utilizada, instituições comunitárias e as redes sociais
são enfraquecidas, dispersão de grupos de familiares, e a identidade
cultural, autoridade tradicional e o potencial para ajuda mútua se
perdem ou diminuem. Sob outro prisma, em matéria ambiental, dois
princípios norteiam de forma marcante a reflexão jurídica, quais sejam, o
da prevenção (preocupação com o dano provável) e o da precaução
(preocupação com o dano razoavelmente possível). Na hipótese, a tutela
cautelar pretendida se baseia justamente no princípio da precaução, pois
visa resguardar o meio ambiente de um dano possível, de larga escala,
decorrente da instalação de terminal portuário em área ocupada
regularmente por uma comunidade. O Estado do Maranhão teve a
oportunidade de trazer informações aos autos, juntando os documentos
necessários, para contribuir na formação do juízo ora emitido, mas não o
fez, impossibilitando a análise da regularidade do procedimento de
licenciamento ambiental do empreendimento. O procedimento de
licenciamento, conforme afirmado e comprovado pela autora (fl. 202),
tramita somente perante o órgão de licenciamento estadual, a despeito de
sua natureza (instalações portuárias no mar territorial) que,
obrigatoriamente, o submete a análise pelo IBAMA. Ademais, conforme
consta do documento de fl. 230, existem notícias de que a comunidade
afetada não fora devidamente cientificada do procedimento, o que, em
tese, macularia o licenciamento pela falta de publicidade e devida
ciência dos diretamente afetados pela instalação do empreendimento. Para
o desenvolvimento de atividades ocasionadoras de danos ambientais é
imprescindível que no procedimento que antecede o seu licenciamento haja
a participação dos afetados, ofertando-lhes a oportunidade material de
se manifestarem no processo, por exemplo, com a ocorrência de audiências
públicas em locais próximos da comunidade, a fim de não se inviabilizar
o acesso. Em Juízo de cognição sumária, pelos motivos expostos acima,
vislumbro a fumaça do bom direito no pedido da autora. O periculum in
mora está presente, tendo em vista a instabilidade social que tem
causado toda a celeuma na área ocupada pela comunidade do Cajueiro,
conforme já assentado na decisão de fls. 213/217 e do que consta dos
documentos juntados às fls. 230/231, aliada a necessidade de resguardo
dos direitos dos afetados. No caso em apreço, tendo em vista a natureza
cautelar da medida ora deferida, não há perigo de irreversibilidade.
Assim, por medida de cautela, merece deferimento a liminar pleiteada
contra o ESTADO DO MARANHÃO, ante a presença do fumus boni iuris e do
periculum in mora. DISPOSITIVO Diante do exposto, DEFIRO A LIMINAR
REQUERIDA contra o ESTADO DO MARANHÃO e, por conseguinte: a) DETERMINO
que o requerido ESTADO DO MARANHÃO se abstenha de dar seguimento ao
processo licenciatório do Terminal Portuário de São Luís - WPR (Processo
SEMA n. 108205/2014), até o julgamento da presente ação. Fixo multa
diária, em caso de descumprimento, no valor de R$ 15.000,00 (quinze mil
reais). Quanto ao recurso de Agravo de Instrumento interposto pela
requerida WPR, mantenho a decisão de fls. 213/217 por seus próprios
fundamentos, visto que os argumentos trazidos pela requerida não possuem
força suficiente para modificar o entendimento exposto na decisão
questionada. OFICIE-SE à eminente Desa. Maria das Graças de Castro
Duarte Mendes, relatora do Agravo de Instrumento nº
9569-84.2014.8.10.0000, no intuito de prestar as devidas informações
(CPC, art. 527, IV). INTIME-SE. CITE-SE o requerido ESTADO DO MARANHÃO
para responder a ação, no prazo de 20 dias (CPC, art. 802), indicando as
provas que pretende produzir. CUMPRA-SE. Cópia da presente decisão
servirá como mandado. São Luís, 04 de novembro de 2014. DOUGLAS DE MELO
MARTINS Juiz de Direito Titular da Vara de Interesses Difusos e
Coletivos
Governo do Estado e empresa WPR se
aliam para realizar audiência pública no Comando Geral da Polícia Militar
Comunidade do Cajueiro reúne Defensoria Pública, Ministério Público,
pesquisadores, comunidades vizinhas, autoridades dos Legislativos municipal e
estadual, Delegacia Agrária, movimentos sociais e demais parceiros em Audiência
Popular para debater tentativa de implantação de projeto na área e as
violências a que as comunidades vêm sendo submetidas nesse processo
Cajueiro – 29 de
outubro de 2014
A comunidade do Cajueiro realizou, na tarde desta
quarta-feira, dia 29 de outubro, na sede de sua Associação de Moradores, Audiência
Popular para discutir os impactos da tentativa de implantação, na área, de um
complexo portuário pela empresa WPR.
Além dos impactos socioambientais, foram alvo das discussões
as truculências da empresa de segurança contratada pela WPR, desde que esta se
apresentou como proprietária da área do Cajueiro. Além de se sentirem
aterrorizados com a presença do que consideram uma verdadeira milícia armada,
os moradores passaram a conviver com cancelas proibindo o livre acesso em seu
território, coação para venda de imóveis na região e com a tentativa de
criminalização, com abertura de ações judiciais contra moradores e militantes
sociais.
A Audiência Popular realizada no Cajueiro foi, também, uma
resposta da comunidade, e de várias instituições que lá estiveram representadas,
à forma como a Secretaria Estadual de Meio Ambiente (SEMA), vem se portando em
relação à tentativa de instalação do empreendimento da WPR na região, sem
nenhuma preocupação com a idoneidade e transparência que um órgão público deve
observar. Um exemplo foi a tentativa de audiência pública na Vila Maranhão, que
os representantes da secretaria tentaram, a todo custo, realizar, mesmo sem o
aval da comunidade diretamente afetada. Os moradores conseguiram barrar essa
tentativa de institucionalização de uma ilegalidade, já que não foram
observados os prazos para convocação da audiência, nem foi observada a
publicidade exigida para os estudos de impacto ambiental, numa clara tentativa
de se acelerar, sem discussão, os procedimentos para que o empreendimento seja
instalado de qualquer maneira.
Por último, a Secretaria
Estadual de Meio Ambiente publicou, em seu sítio na Internet, na terça-feira,
dia 28 de outubro, a chamada para audiência pública a se realizar no COMANDO
GERAL DA POLÍCIA MILITAR, no dia seguinte, não respeitando, mais uma vez, os
prazos que devem ser observados. E mais: a assinatura da chamada traz a data de
21 de setembro, como forma de dar uma aparência de legalidade ao ato que foi,
na verdade, trazido a público somente no dia 28, na véspera de sua realização.
Além disso, a realização de uma Audiência Público no Comando
Geral da polícia Militar pode ser considerada algo completamente inusitado:
além de o Comando Geral ficar a quilômetros da comunidade impactada, a
realização de uma audiência nas dependências da Polícia tem, segundo interpreta
a comunidade, o claro objetivo de intimidar e impedir a efetiva participação
dos reais interessados no assunto.
Mesmo com
intimidação, Audiência Popular é realizada, contando com representantes de várias
instituições
Intimidação - Ao chegar à Associação de Moradores, os participantes da
audiência depararam-se com duas viaturas da Polícia Militar no local, com a
presença de vários policiais fardados. Questionados sobre quem teria solicitado
sua ida até a comunidade, eles informaram que foram acionados por seu
Comandante “para garantir a segurança”. Os policiais somente deixaram o local
depois que o representante do Ministério Público presente à audiência foi até
eles, e solicitou que se afastassem, já que não havia necessidade alguma de
suas presenças, e que elas inibiriam a participação das pessoas, e que essa
participação é que legitima uma audiência pública, onde todos podem e devem se
pronunciar aberta e livremente sobre o assunto da qual é objeto.
Ao chegar à Associação de Moradores, os participantes da Audiência Pública depararam-se com viaturas e policiais
Participantes da Audiência Popular no Cajueiro
Pelo Ministério Público do Estado do Maranhão, participou da
Audiência Popular no Cajueiro o promotor agrário Haroldo Brito; pela Delegacia
Agrária, o delegado Carlos Augusto; pela Defensoria Pública, o defensor Alberto
Tavares, do Núcleo Regularização Agrária da Defensoria; pela Secretaria
Municipal de Urbanismo, órgão da Prefeitura de São Luís, o superintendente da
área de Terras, Habitação e Regularização Fundiária, Anderson Lindoso; Saulo
Arcangeli, da Central Sindical e Popular, CSP-Conlutas; Rafael Silva, da
Assessoria Jurídica da Comissão Pastoral da Terra, CPT; Padre Clemir, da
Coordenação da CPT no Maranhão; professores, pesquisadores e estudantes da
Universidade Federal do Maranhão, membros do Grupo de Pesquisa: Desenvolvimento,
Modernidade e Meio Ambiente, GEDMMA; Saulo Costa, também da CPT; o deputado
estadual Bira do Pindaré (PSB), presidente da Comissão de Direitos Humanos da
Assembleia Legislativa do Maranhão; a representação do Gabinete da Vereadora
Rose Sales (PCdoB), da Comissão de Regularização Fundiária da Câmara de
Vereadores de São Luís; Congregação Irmãs de Notre Dame de Namur, representadas
pela Irmã Ane; moradores das áreas vizinhas, que também sofrerão impactos caso
esse projeto seja aprovado pelo governo do Estado, entre estes: Rosana e Maria
do Socorro, do Taim; Maria Máxima Pires, do Rio dos Cachorros; Dona Maria, da
Camboa dos Frades, além do grande número de moradores do Cajueiro que
compareceu à Audiência Popular, lotando a sede e o entorno da Associação de
Moradores, que foi a instituição que convocou a Audiência, na pessoa do Senhor
Davi.
Como presidente da Associação, Davi deu as boas-vindas e
declarou iniciados os trabalhos da audiência. Em seguida, Rafael Silva,
advogado, fez questão de ressaltar a importância daquele evento, instando todos
a participarem tranquilamente do processo: “Audiência Pública é esta que está
acontecendo aqui, não aquela situação
absurda que se criou no Comando da PM. Não estamos do lado de uma estrutura do
Estado que sirva de gabinete de grandes empresas, como acontece com a SEMA e
com a Secretaria de Indústria e Comércio”. Ele chamou atenção ara o fato de que
muitas das empresas beneficiadas com o aval rápido a seus projetos são as que
dão dinheiro que financia campanhas eleitorais. “Ninguém vai legitimar a farsa
que está sendo montada na PM a pedido da SEMA, importante ficar claro”, disse
Rafael que, contrapondo-se tanto a audiência na PM quanto à presença de
policiais que estiveram na Audiência popular no Cajueiro, afirmou: “Este é um
espaço em que as pessoas podem falar, denunciar. É um espaço de solidariedade”.
Ele solicitou que as autoridades presentes se posicionassem
no sentido de tranquilizar os moradores, garantindo a participação, para que
todos pudessem falar abertamente, tirar suas dúvidas sobre o empreendimento, e
contar como se sentiram coagidas com a presença dos seguranças da WPR na área.
O promotor público se posicionou: “Quero que todos fiquem
tranquilos em relação a isso. Todos podem falar”, completou. Rafael Silva
perguntou, então, ao delegado Carlos Augusto: “As pessoas têm liberdade para
falar o que pensam neste momento?”, ao que ele respondeu: “É direito de cada um
manifestar seu pensamento. Podem falar tranquilos, vivemos em um país livre”.
Por sua vez, o superintendente de Terras, representante da
Prefeitura, declarou: “não só podem como devem manifestar todas as suas
opiniões sobre o que tem acontecido. As coisas só podem acontecer, ouvindo-se a
comunidade. Esse é o entendimento da Secretaria e da Prefeitura”, afirmou.
Ministério Público:
Audiência na polícia é nula de pleno direito
Com o início das exposições, o promotor agrário Haroldo
Brito informou que iniciou conversas com seu par, Fernando Barreto, promotor do
Meio Ambiente, e que este, ao tomar conhecimento das ações da WPR e da
tentativa da empresa e da SEMA em realizar uma audiência pública às pressas na
sede da Polícia Militar, demonstrou não ter dúvidas de que essa audiência na
Polícia é nula de pleno direito. “E buscaremos, eu e o Dr. Barreto, sua
anulação na justiça. Se não anularmos no Tribunal, anulamos em Brasília (em
instâncias superiores), declarou.
Para o promotor, há indícios de práticas de improbidade administrativa
(crimes cometidos por servidores públicos) e de prática de crime (por
terceiros). Ele declarou ainda que somente não procede a extinção do inquérito
aberto em razão desses indícios, que precisam ser apurados (crimes poderiam ter
sido cometidos durante esse processo, por autoridades e por parte da empresa).
Como esse é mais um conflito envolvendo questão fundiária, o
promotor alertou para o crescimento do número de conflitos envolvendo posse de
terra no Maranhão, onde há uma lista de pessoas ameaçadas, geralmente
lideranças de camponesas. Dessa lista, disse ele, cinco pessoas já foram
assassinadas.
O promotor explicou que os moradores do Cajueiro têm
direitos a serem respeitados. “Vocês estão na posse há muito mais de cinco
anos. Isso garante o direito de todos vocês”. E repetiu: “Vocês têm direitos.
(Geralmente, o que vem acontecendo é que) só criminalizam a conduta dos
posseiros, nunca a dos ditos proprietários. Quando a reclamação é feita pelos
posseiros, nem é feita a queixa (a polícia não leva em consideração e não
registra a ocorrência)”, disse, atestando o que vem sendo denunciado há anos
pela CPT e pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, MST. Para tentar
diminuir essa verdadeira perseguição a quem ocupa a terra de boa-fé para produzir
e tirar seu sustento, o promotor informou que esteve com o secretário estadual
de Segurança, solicitando que os delegados fossem orientados a atender
corretamente os camponeses e a lavrar os registros.
Sobre o fato de a empresa pôr seus agentes para adentrar
quintais na comunidade, e marcar casas, sinalizando de forma ameaçadora e sem
consultar os moradores, ele orientou: “Na casa dos senhores não se pode entrar
sem mandado do juiz ou sem autorização dos senhores”.
Placas colocadas pela empresa na área do Cajueiro intimidando os moradores
Impactos que
podem ser causados pelo projeto do Terminal Portuário
Saulo Costa, da CPT, passou, então, a dar detalhes do que a
empresa pretende fazer com a área que pertence aos moradores do Cajueiro e suas
comunidades (o Cajueiro é formado ainda pelas comunidades de Parnauaçu e Andirobal).
“Temos que nos apropriar desse discurso, do que seja esse empreendimento, do
que a empresa está divulgando sobre ele, para sabermos com o que estamos
lidando”, disse, apontando que algumas dessas respostas podem ser encontradas
no Estudo de Impacto Ambiental e no Relatório de Impacto ao Meio Ambiente
(EIA/RIMA), peças fundamentais para se entender o que pode causar numa
comunidade um empreendimento desse porte.
Nesses documentos, Saulo explicou, a empresa assume que há
inúmeros impactos para a área (composta, como já dissemos, de uma rica
estrutura ambiental, como manguezais, matas, nascentes e brejos, essenciais
para o equilíbrio ecológico de São Luís). Saulo informou que, segundo esses
relatórios, a empresa diz que todo esse sacrifício pode ser recompensado com a
implantação do projeto, já que o Terminal Portuário traria desenvolvimento para
a região.
Além de Saulo Costa, membros do GEDMMA, que também
analisaram os documentos, levantaram pontos intrigantes do EIA/RIMA. O
pesquisador Jadeylson destacou que as peças não detalham a emissão de poluentes
e não demonstram impactos da preparação da área: se houver dragagem do mar na
região, a reprodução de peixes pode ser drasticamente afetada, já que, além da
areia, o maquinário utilizado draga também as espécies que se reproduzem no
local.
Chamou-se também atenção para o fato de que, antes de se
discutir o licenciamento de qualquer projeto para a área, o Estado tem que
responder uma importante questão: quem, de fato, é seu proprietário.
Afinal, a quem
interessa o projeto do Terminal Portuário?
A WPR surge no documento como sendo proprietária do local,
mas essa é uma questão que precisa ser resolvida: Durante o ano eleitoral de
1998, a ocupante do Governo do Estado, Roseana Sarney, que concorria à reeleição,
reconheceu o direito dos moradores, que lá já estavam há décadas, através da
entrega de títulos de propriedade condominial.
Durante a campanha de 2010, a mesma candidata, em novo
processo de reeleição, recebe mais de trezentos e quarenta mil reais para a
campanha, conforme consta sua prestação de contas no Tribunal Regional
Eleitoral, doados pela empresa Suzano que, embora não apareça agora no
EIA/RIMA, é beneficiada com a implantação do pretendido porto, por onde poderia
exportar seus produtos. No ano seguinte, logo nos primeiros meses de seu novo
mandato, a governadora desapropria a área em nome da Suzano Papel e Celulose.
Atualmente, segundo a própria empresa reivindica, a área teria
sido comprada, pela WPR, das mãos de um particular, que seria dono de toda essa
vasta área. Não fica claro, e o Estado não responde como essa área teria ido
parar nas mãos desse indivíduo, apontado pelos moradores como, na verdade, um
especulador de terras em São Luís.
A relação entre a tentativa de construção do porto pela WPR
e a Suzano reside no fato de que ele seria utilizado para escoar a produção
desta última, que embora atualmente não apareça nominalmente entre os que
pleiteiam a área, isso já foi de sua intenção, como atesta a tentativa de
desapropriação feita pela governadora do Estado em 2011 em benefício da empresa, alegando "interesse público". O EIA/RIMA também aponta,
entre os produtos a serem escoados pelo porto, pasta de celulose, item da pauta
de exportações da Suzano.
As doações para campanhas eleitorais no Estado não pararam
em 2010 (naquele ano, além de Roseana Sarney, Jackson Lago, também candidato ao
governo e hoje já falecido, recebera doação da Suzano, em quantia inferior à
sua oponente): segundo informações no sítio do Tribunal Regional Eleitoral do
Maranhão, durante as eleições deste ano de 2014, Victor Mendes, membro do grupo
político da governadora e ex-titular da Secretaria de Meio Ambiente, também
recebeu verba da Suzano para sua campanha. Talvez esses dados ajudem a explicar
a pressa em licenciar a área para a construção do porto, já que o grupo político
perdeu o comando do Governo do Estado, que será comandado por Flávio Dino, da
oposição, a partir do ano que vem.
Com tudo isso, a questão fundiária do local precisa ser
respondida antes que se aprove qualquer projeto para a região. Essa posição é
referendada pelo defensor público Alberto Tavares, que participou da Audiência
Popular. Ele ingressou com ação na justiça em defesa da comunidade, obtendo liminar
que proíbe qualquer tentativa de intimidação aos moradores, como as que vinham
sendo feitas pela WPR à luz do dia.
Segundo apontado na Audiência no Cajueiro, um dos possíveis
motivos para hoje a Suzano não figurar diretamente entre as maiores
interessadas nesse projeto pode estar ligados ao fato de a empresa precisar
manter sua imagem perante o mercado internacional. Para manter o selo de
certificação que detém, ela não pode ter seu nome vinculado a conflitos como o
que hoje a WPR promove no Cajueiro. Além do Cajueiro, a Suzano estaria
vinculada a diversos conflitos fundiários em comunidades camponesas, em
diversos estados brasileiros, incluindo outras áreas no Maranhão, como ocorre
no leste do Estado. Outro foco de grande conflito envolvendo a empresa está
situado no Estado da Bahia. Assim, áreas vitais para sua atividade, como transporte
e logística, são transferidas para terceiros, de forma que ela não pareça
diretamente ligada aos conflitos. No caso do Cajueiro, ela seria uma das principais
interessadas no projeto do Terminal Portuário, sendo, portanto, uma das autoras
do drama hoje vivido pelos moradores.
Moradores do Cajueiro
respondem a ameaças com resistência e participação na Audiência Popular
A Audiência Popular começou no início da tarde...
... e estendeu-se até a noite, sempre com boa participação...
...A Associação de Moradores ficou lotada, e a Audiência Popular foi acompanhada por participantes que se posicionaram até na área externa
Resistência
Os moradores vêm resistindo a ações que consideram
verdadeira violência. Um exemplo dessa resistência ocorreu quando bloquearam a
BR 135, e com ela o acesso ao Porto do Itaqui, como forma de denunciar a
atuação irregular da dita empresa de vigilância contratada pela WPR para
intimidar os moradores. Eles impediram, ainda, a realização da audiência
pública na Vila Maranhão por considerarem várias irregularidades em sua
convocação, sendo realizada fora da comunidade diretamente afetada, por vão
observar os prazos exigidos pela legislação e por não observar o princípio da
publicidade, através do qual deve haver comunicação em tempo hábil para que
todos possam participar. A Audiência Popular na área, com a presença de várias
autoridades e apoiadores da causa, é mais uma forma de se inserir na discussão
desse processo, inserção essa que vem sendo tolhida de todas as formas por quem
deveria assegurar sua participação.
Com a apresentação dos elementos que estão no EIA/RIMA e
discussão das relações entre as empresas envolvidas e autoridades públicas, e
que não aparecem à primeira vista e, pelo visto, são ocultadas propositalmente,
Bartolomeu Mendonça, também do GEDMMA, ratificando o que dissera Rafael Silva,
considerou que a audiência feita no quartel da Polícia Militar não é
reconhecida pela comunidade, que estava, ao contrário, discutindo em sua
Associação de Moradores os pormenores do empreendimento em questão, já que era
esse o objetivo de uma verdadeira audiência pública.
As falas da comunidade iniciaram por Dona Fátima, que questionou
se a criação da Reserva Extrativista de Tauá-Mirim, apontada como estratégica
para assegurar a permanência das comunidades e conter a ameaça representada
pelo avanço indiscriminado de grandes empresas na região, seria capaz de barrar
esse ataque, que estaria acabando com as comunidades da Zona Rural. Maria
Máxima Pires, entusiasta da criação da Reserva e moradora da comunidade de Rio
dos Cachorros, que também fica na área da Resex, chamou atenção para o fato de
esse ser uma alternativa ao avanço predatório sobre as comunidades. “O que as
pessoas (na verdade as empresas e o governo) não entendem é que o que queremos
é apenas o direito de permanecer nas nossas comunidades. E isso é divulgado
porque tanto o governo federal quanto o governo estadual não deixam os outros
saberem que nós existimos, mas é daqui que sai a verdura, que sai o peixe para
alimentar a cidade”, disse ela. Nesse sentido, a invisibilização a que são
submetidas facilita o processo de remoção das comunidades. A Resex pode ser
vista como uma estratégia para inverter esse processo, mostrando a todos a
importância de se preservar a área e o papel desempenhado pela existência das
comunidades nessa preservação, já que é de lá que elas tiram seu sustento, e
são conscientes da necessidade de se conservar o local para garantir suas
sobrevivências. Para Máxima, essa é uma oportunidade que os moradores têm de se
unir em torno da defesa de seus modos de vida e de seu território. E completa,
dizendo que a luta não deve ser apenas para permanecer, mas para que as
políticas públicas possam chegar até as áreas, com escolas, postos de saúde, e
toda a infraestrutura necessária: “O problema do Cajueiro não é só do Cajueiro,
mas de Rio dos Cachorros e de outras comunidades, como foi dito aqui. A luta
não é fácil, mas a gente consegue”, completou.
José da Silva, conhecido como “Seu Batata”, também foi enfático:
“Estamos sendo ameaçados. Tenho 78 anos de idade, nasci aqui na área. Eles (da
WPR) vinham de carro até o Andirobal e marcavam as casas. Não precisamos disso
aí (do empreendimento e da indenização que porventura a empresa daria para os
que se retirassem). Temos nosso meio de vida. Estamos na beira da praia. Temos
nosso caranguejo, nosso peixe, camarão. Eles fizeram audiência no quartel da
polícia para intimidar”, disse, e completou: “O Cajueiro sempre foi área de
sustentabilidade, que pesca e que planta e colhe. Se a gente sair daqui, vai
pra onde? Da Maioba até o Porto de Mocajituba eu conheço, e já está tudo cheio,
com esgoto, com conjunto habitacional. Só se a gente for para debaixo de uma
ponte”, indignou-se ele.
Seu Batata: "Estamos sendo ameaçados. Eles fizeram audiência no quartel da Polícia para nos intimidar"
Davi, presidente da Associação, demonstrou indignação com “a
forma como a empresa chegou aqui, a forma como está trabalhando. Pra que
audiência na polícia? Não vamos aceitar da maneira que está”. Ele lembrou que,
devido à luta da comunidade, a empresa chegou a processá-lo, o que ele considera
que foi feito por base em calúnias plantadas pelos representantes do projeto.
Padre Clemir, da CPT, ressaltou a relação que as pessoas da
região têm com a natureza, com o mar, em contraposição ao modo como a empresa
chegou querendo tirar as pessoas e dizendo-se dona. Ele questionou o fato de a SEMA
“correr com o processo” de licenciamento, no final do governo, atropelando todo
o ritual que deve ser observado num caso delicado como esse. E questionou: “O
que há por trás desse empreendimento?”. Clemir lembrou que a comunidade está
mobilizada e resistindo, como quando “fechou a BR” para chamar atenção ao grave
fato de a empresa ter colocado milícia armada dentro do Cajueiro. Para ele,
também é importante denunciar que o projeto do terminal portuário atinge outras
comunidades, como Jacamim e Porto Grande, e elas não estão sendo comunicadas.
“Essas informações não podem ser omitidas”, disse.
Ariovaldo, morador do Cajueiro, foi enfático: “Essa área não
é de vocês (da empresa): essa área é nossa!”, afirmou.
Bartolomeu, do GEDMMA, retomando a fala do Padre Clemir,
lembrou que há uma área de influência direta, e há, também, uma área de
influência indireta, e que esse não é um empreendimento pequeno – portanto
pequenos não são, também, os impactos gerados por ele. Outra crítica forte
feita pelos presentes diz respeito ao fato de a empresa investir na cisão da
comunidade, negociando individualmente com os posseiros, utilizando de
intimidação “e jogando um vizinho contra o outro, fazendo o trabalho que seria
do estado, que não apareceu, e que não disse para as comunidades o que seria o
empreendimento”.
Ressaltou-se também que os impactos vão para todos,
indistintamente, e que por isso todos na região devem se unir. Arnaldo, do GEDMMA,
lembrou um dado importante referente à dispersão de resíduos no ar, os chamados
“inaláveis, a poeira que se vai respirar. E isso está no EIA/RIMA. Vai
ultrapassar todos os níveis aceitáveis”, alertou, lembrando ainda que “a
Termelétrica Porto do Itaqui já joga na atmosfera uma quantidade considerável
de substâncias tóxicas que já atingem São Luís inteira: metano, cobre e outros
gases e metais sendo inalados”, disse. A termelétrica está instalada na região.
Processo de
licenciamento tocado às pressas pela secretaria de Meio Ambiente, mesmo cheio
de controvérsias
Para o defensor público Alberto Tavares, que mais uma vez
reforçou a necessidade de se definir a questão fundiária, há duas importantes
questões que dizem respeito a esse problema: uma é a ambiental, com os impactos
que os chamados grandes empreendimentos trazem para São Luís, e a outra é
justamente a regularização das terras. A empresa age no vazio da regularização
fundiária, aproveitando-se dessa indefinição: “O que a gente está defendendo
perante a SEMA? Que não é possível dar continuidade a esse processo de
licenciamento sem que a questão fundiária esteja resolvida”. Daí a importância
do processo de resistência da comunidade, que pressiona pelo respeito aos seus
direitos. Segundo ele, é possível verificar vícios até mesmo nos casos em que
algum morador tenha saído de sua casa mediante indenização, haja vista que,
tanto para a Defensoria quanto para o Ministério Público, há fortes indícios de
coação nesses casos. O defensor disse trabalhar no mesmo sentido da comunidade,
para assegurar-lhe o manifesto direito de permanência em seu local. Esses
também são os esforços de todas as parcerias instituições celebradas em defesa
da comunidade: promotorias do Meio Ambiente e Agrária, Defensoria Pública, CPT,
Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Maranhão, CSP
Conlutas, Comissão de Regularização Fundiária da Câmara de Vereadores, entre
outras.
Alberto Tavares, defensor público: Há fortes indícios de que a empresa que pretende se instalar na área tenha coagido moradores a vender suas casas...
...na região, é possível ver várias casas que já foram derrubadas a mando do empreendimento
“Estamos aqui para
enfrentar até o fim”
O Senhor Joca, 85 anos, em depoimento emocionado, afirmou:
“Moro aqui há 35 anos, e quero passar meus últimos dias de vida aqui. Não quero
vender essa área para ninguém. Estamos aqui para enfrentar até o fim”, disse,
convicto. “Seu” Joca planta, entre outros produtos, abacaxi, fruto vendido por
ele na Feira do Anjo da Guarda, bairro da área Itaqui Bacanga, em São Luís.
Seu Joca: Vamos resistir!
Dona Maria, também moradora, concordou que é preciso unir e
resistir, afirmando que “eles (da empresa) não compraram (a área) da mão de
nenhum de nós, que estamos aqui há 35, 40 anos, e não somos lixo, que é como essa
empresa quer nos tratar”.
Anderson Lindoso, da Superintendência de Terras da
Prefeitura, disse que a Secretaria de Patrimônio da União (SPU) foi informada
para que também se pronuncie sobre a situação. Ele destacou que as informações
que estavam sendo dadas durante a Audiência Popular servirão para municiar a
ação da Prefeitura na questão. “Só o fato de vocês estarem aqui esse tempo todo
já garante o direito de vocês, com o cuidado que vocês têm aqui (em usar e
preservar as características do local). Desenvolvimento não é só máquina, mas o
trabalho que vocês têm aqui, com a pesca e tudo o que vocês fazem. Vocês também
têm o assentamento: o Iterma fez a escritura em forma de condomínio para vocês.
Ninguém é obrigado a nada. Não são obrigados a vender ou a sair do que é de
vocês. Vocês estão executando um direito legítimo. Estou feliz em estar
presenciando esse momento de união entre os moradores, e com essas instituições
que estão aqui ao lado de vocês, Ministério Público, Defensoria e todos os
demais. É muito importante essa unidade, porque não adianta estas instituições
serem parceiras se vocês não estiverem unidos. Então é muito gratificante ver
essa união aqui”, declarou.
Anderson Lindoso, superintendente de Terras do município, comprometeu-se a levar as demandas da comunidade à Prefeitura
“Audiência com essa
pressa toda, no Comando da Polícia, não é coisa séria”. Além da Audiência Popular
realizada no Cajueiro, haverá audiência na Assembleia Legislativa sobre o
assunto
O deputado estadual Bira do Pindaré (PSB), por sua vez,
relatou a rapidez com que foi procurado pela empresa, logo em seguida às
manifestações da comunidade solicitando sua intervenção na questão. No dia
seguinte à interdição da BR 135 pelos moradores denunciando a presença de
milícia no local, o deputado fez um pronunciamento sobre a forma violenta de
ocupação pela empresa no Cajueiro. Imediatamente, no dia após seu pronunciamento,
16 de outubro, ele foi procurado em seu gabinete por pessoas que se
apresentaram como empresários e advogados da WPR, falando que compraram a área
para a construção de um porto de R$ 800 milhões, e que a área não estaria
dentro da Resex Tauá-Mirim (há decisão judicial que proíbe que seja levantado
qualquer grande empreendimento dentro da área da Resex enquanto sua criação não
for determinada pelo Governo Federal, que disse, por sua vez, depender de
anuência do governo estadual para proceder a criação da Reserva).
Durante a Audiência Popular, Bira solicitou aos
pesquisadores que estudam a área da Resex para que apresentem a documentação
que comprova a inserção do Cajueiro na Reserva. Ele também alertou para a mesma
questão que a Defensoria Pública apontou: “O que estamos vendo aqui em primeiro
lugar é a questão fundiária, de quem tem direito ao território. Se a aquisição
que eles dizem que fizeram é justa ou não é, se é legal ou não. Estive na área
e conversei com várias pessoas. O que eu percebi claramente é que as pessoas
não querem sair. Então não tem que ter pressa em relação a isso. Até hoje não
consegui dessa empresa explicação sobre o título do Iterma que foi dado (pelo
Estado) a vocês. Dado em 98, perto das eleições. Agora, no mesmo governo, da
mesma governadora, acontece isso com vocês. As pessoas estão aqui de maneira
mansa e pacífica. Não são invasores. Estão de maneira consolidada. Não se apressem.
Não se sintam pressionados. Aqui não há dúvida em relação ao direito (de vocês)
à posse. Quem saiu, teve sua casa derrubada pela empresa. Não tem porque
arredar o pé. Declaro apoio à luta dos moradores do Cajueiro. Audiência no
Comando da Polícia, com essa pressa toda, não é coisa séria. Não é audiência
pública: é fechada, a quatro portas. Dizer que estão trazendo o progresso
quando falam em instalação de grandes empresas, em porto de 800 milhões, é uma
cantilena que a gente ouve há mais de trinta anos e não resolve o problema”,
declarou o deputado.
O Presidente da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa, deputado Bira do Pindaré, agendou audiência na Assembleia para tratar do assunto. A audiência deverá contar com moradores, representantes do atual e do futuro Governo do Maranhão, e também da WPR
Saulo Costa comunicou que procedeu o georreferenciamento do
Cajueiro, via GPS, e que esses dados seriam repassados para a Secretaria
Municipal de Terras, Habitação e Urbanismo para contribuir com a delimitação da
localidade, demonstrando assim sua posição enquanto zona rural e sua
delimitação dentro da área da Resex Tauá-Mirim. O superintendente Anderson Lindoso
colocou-se à disposição para receber essa colaboração, e a contribuir para que
as políticas públicas cheguem até o Cajueiro, como a construção de creche, por
exemplo. Ele afirmou que a questão da regularização fundiária já está pautada
pelo órgão municipal, e comprometeu-se a levar as demandas da comunidade nas
demais áreas, como infraestrutura e educação, para a Prefeitura.
AUDIÊNCIA –Bira
do Pindaré chamou a comunidade para participar da Audiência convocada pela
Comissão de Direitos Humanos da Assembleia para discutir o assunto. Será dia 19
de novembro, às 14h30. Rafael Silva solicitou ao deputado que ele convide para
a referida Audiência os membros do secretariado do governador eleito.
Empresa de segurança
contratada pela WPR para aterrorizar moradores é clandestina
Carlos Augusto, delegado agrário, informou que a empresa que
aterrorizou os moradores (dizendo-se empresa de vigilância e segurança privada),
de forma intimidatória, foi multada. Segundo ele, a mesma empresa, Leões
Dourados, já havia sido advertida anteriormente.
Quanto à manutenção, pela empresa de segurança, de contêineres que servem como base de
apoio aos seus seguranças que atuam no local e dos quais a comunidade exige
imediata retirada, ele afirmou que estaria dependendo apenas de informações que
lhe seriam encaminhadas pela Polícia Federal para que pudesse agir, e que, se
estas não chegarem logo, iria pessoalmente buscá-las na PF. Sobre a realização
da Audiência e a luta dos moradores para preservar a comunidade, o delegado
Carlos Augusto asseverou: “a resistência de vocês vai surtir muitos efeitos”.
Sobre a necessidade de preservação da área, de acordo com as informações dadas
durante a Audiência Popular, ele considerou que “essa área verde é de
fundamental importância para todos nós da cidade”.
Delegado Carlos Augusto: Leões Dourados é irregular
Moradores são
conscientes de que ameaça somente poderá ser afastada se eles se unirem
Maria do Socorro, moradora do Taim, lembrou que esse era um
momento para as comunidades estarem brigando por infraestrutura, “e não ainda
contra essas empresas, para ficarmos aqui nas nossas terras. Esse porto vai
atingir a todos nós”, disse, conclamando a todos a darem as mãos nessa luta em
defesa da região.
Manoel Sodré, do Cajueiro, foi em igual direção: “devemos,
mesmo com nossas divergências, nos unir contra essas empresas que querem nos
expulsar daqui. São Paulo é um exemplo: lá, não tinha seca. Tem água, mas olha
o que fizeram, olha o Tietê. Nos anos 80, quando eu trabalhava na área da Vale,
aqui era diferente”. Ele conta que, naquela época, como pescador, a
profundidade do mar era maior. “Dava pé”, diz. “Hoje, tudo aterrado”. E
completa: “Essa área aqui não pode acabar. Não somos invasores. Invasores são
eles, que estão chegando agora. Segundo ele, o Governo do Estado tenta fazer
tudo às pressas, como um “rolo compressor” nos dois meses que faltam para
acabar a atual gestão. “Esse governo, que está aí desde que eu era criança,
quer tirar a gente. Mas cadê ele, ensinando a pescar, dando condições para nós
plantarmos? Querem é acabar com o que temos. Eu jamais quero sair daqui. Não
vamos deixar esse pessoal passar o rolo compressor em cima da gente”, falou.
União contra a
extinção das comunidades da Zona Rural de São Luís
Saulo Arcangeli, da CSP Conlutas, retomou a necessidade de
assegurar o direito das comunidades ao local que tradicionalmente habitam e de
onde tiram seu sustento. Segundo ele, há a necessidade de uma ofensiva de toda a
sociedade, em conjunto com os movimentos sociais e as comunidades da área, para
se garantir a Reserva Extrativista Tauá-Mirim, vista como estratégica para assegurar a preservação ambiental e o direito dos moradores aos seus territórios (veja detalhes mais à frente). Ele acrescentou que, como pode
ser visto, com a ampla participação assegurada à comunidade, a audiência que
pode ser considerada legítima é “essa aqui”, referindo-se à Audiência Popular.
“Devemos estar juntos até a vitória, até a vitória final”, conclamou.
Arcangeli, da CSP Conlutas: ofensiva para garantir a Reserva Extrativista do Tauá-Mirim
Dona Maria, da Camboa dos Frades, deu um depoimento
dramático sobre como as comunidades do entorno são tratadas pelos
empreendimentos. A Camboa dos Frades é hoje a comunidade mais afetada pela
Termelétrica Porto do Itaqui, que fica na região, e que foi responsável pelo
deslocamento da Vila Madureira. “A Camboa dos Frades não morreu, ela está só
precisando de ajuda, e por isso estou aqui. Ainda somos, lá, dez famílias que
resistem”, conta.
Ela revela que a mesma empresa que aterrorizou o Cajueiro,
contratada pela WPR para fazer serviços de segurança e que é considerada
irregular pela Polícia Federal, segundo informou o delegado agrário (a Polícia
Federal é um dos órgãos responsáveis pelo acompanhamento e controle das
atividades das empresas do setor de segurança), já agiu de forma parecida, com
truculência, na área da Camboa dos Frades. “Chegam dizendo que não podemos
fazer reforma nas nossas casas, nem construir, nem mexer em nada”, denunciou.
Uma mostra dos impactos causados pelas indústrias
da região sobre as comunidades, e que serve também para comprovar como esses
ataques atingem a todas elas e que por isso devem lutar unidas, está no fato de
que, ainda em 2012, comunitários da área da Vila Maranhão e do Cajueiro
denunciaram que a estocagem de carvão mineral no pátio (a céu aberto) da Termelétrica
(UTE Itaqui), com as chuvas de inverno, os resíduos atingiram o leito do rio,
poluindo-o com substâncias tóxicas. Naquela época, as duas comunidades
denunciaram ter sido obrigadas a diminui a atividade pesqueira em razão de a
reprodução do pescado ter sido atingida. Os moradores reclamaram na ocasião que
a fumaça e os resíduos da termelétrica teriam poluído as comunidades e o ambiente
dessa região da zona rural. O fato foi noticiado em rádios e sítios na
Internet.
Termelétrica Porto do Itaqui, que já foi da MPX de Eike Batista e hoje é da Eneva: poluição que ameaça diretamente a Zona Rural, bem como toda a Ilha de São Luís
Enquanto moradores
tratavam com profundidade da situação em que se encontram, Audiência Pública
sem respaldo transcorria na Polícia, sob orientação da Secretaria de Meio
Ambiente
Durante o desenrolar da Audiência Popular no Cajueiro,
chegaram informações da “farsa”, como classificaram os presentes, montada pela
WPR e pela SEMA no Comando Geral da Polícia Militar. Segundo as notícias, os
representantes do Governo do Estado reuniram pessoas de outras comunidades da
Ilha, que não da área diretamente afetada, e deram ares de legalidade ao
acontecimento. Representantes da SEMA chegaram a externar sua “felicidade” pela
conclusão de mais uma etapa para liberar o empreendimento que, segundo eles,
iria gerar empregos no Maranhão, discurso sempre acionado nesses casos.
Para os presentes, o importante agora é buscar, como dito
inclusive pelos representantes das instituições como Defensoria e Ministério
Público na Audiência Popular no Cajueiro, a anulação, na justiça, da audiência
realizada na PM. Para o professor Horácio Antunes, “é hora de juntar todo
mundo, unir forças para mostrar o que as comunidades estão querendo”. Horácio
classificou como vitorioso o movimento de resistência que vem sendo travado
pelos moradores do Cajueiro, destacando a presença das autoridades à Audiência
Popular, que lá estiveram e assumiram compromissos com a comunidade.
Viviane, do GEDMMA, lembrou que a audiência pública
realizada na polícia pode ser considerada ilegal também em relação ao Conselho
Estadual de Meio Ambiente, Consema, que não foi consultado sobre sua
realização.
Além da gigante Suzano, outra grande empresa que apareceu,
durante a audiência na polícia, como interessada no terminal portuário e que
até o momento ninguém sabia de seus movimentos nesse sentido, foi a WTorre, gigante da área de construção e engenharia.
Mais uma demonstração de que transparência não vem sendo o forte dos defensores
do projeto.
Como deliberações da Audiência Popular no Cajueiro, todos
concordaram na necessidade de se alertar toda a cidade sobre o que vem
acontecendo, bem com participar de forma ativa da Audiência convocada para o
dia 19 de novembro, às 14h30, na Assembleia Legislativa do Maranhão, chamando
as comunidades, os representantes das empresas, do atual governo e do
governador eleito. Também deverão ser reunidos os moradores que venderam suas
casas sob coação, para que tudo seja devidamente apurado.
Aproveitando-se a presença e disponibilidade para
interlocução do representante da Prefeitura, a comunidade também deve se reunir
para tratar dos problemas relacionados às políticas públicas e infraestrutura
da área.
Também deverá ser realizado um encontro das comunidades
tradicionais que passam por problemas semelhantes, como Camboa dos Frades,
Quebra Pote e outras. O Instituto Chico Mendes de Conservação da
biodiversidade, ICMBio, órgão do Governo Federal, já teria se posicionado
favorável a essa iniciativa.
Além de entrar judicialmente com o pedido de anulação da
audiência realizada na polícia, as comunidades também farão todos os esforços
possíveis para que o atual governo se posicione logo no sentido de reconhecer
as ilegalidades cometidas nesse processo e “zerar” as iniciativas irregulares
tomadas até aqui.
Dona Nicinha, moradora do Cajueiro, fez a última fala,
agradecendo a presença e disponibilidade de todos, reafirmando que a luta do
Cajueiro é para permanecer no seu lugar, “porque ninguém foi atrás de empresa
alguma para vender suas terras”.
Ao final, todos disseram um sonoro “NÃO” às empresas que
grilam terras e “SIM” à garantia de seus territórios, o que pode está
representado, também, na necessidade urgente de criação da Resex Tauá-Mirim. Concordando
com a necessidade de manter a união contra as ameaças na região, os
participantes encerraram a Audiência Popular cantando versos como:
“Pisa ligeiro, pisa ligeiro, quem não pode com a formiga não
assanha o Cajueiro!”
“Já chega de tanto sofrer, já chega de tanto esperar: a luta
vai ser tão difícil, na lei ou na marra nós vamos ganhar”.
ATUALIZAÇÃO:
Seguindo a mobilização em defesa de sua área, e dando
prosseguimento às deliberações da Audiência Popular, os moradores do Cajueiro
estiveram, durante a tarde da segunda-feira dia 3 de novembro, na sede da
Secretaria Estadual de Meio Ambiente, para protocolar o pedido de impugnação da
audiência realizada no Comando Geral da Polícia Militar do Maranhão.
Vários moradores e seus apoiadores estiveram presentes, e
seguranças contratados pela Secretaria tentaram tumultuar o protesto pacífico,
cujo maior objetivo é protocolar o pedido e sensibilizar a população de São
Luís para a para a situação do Cajueiro. A comunidade avança resistindo contra
a tentativa de ser riscada do mapa pelo conluio entre grandes empresas e o
governo do Maranhão.
Os moradores do Cajueiro conseguiram protocolar o pedido de anulação da autoritária audiência realizada na sede da Polícia Militar maranhense. Os representantes da Sema inicialmente não queriam negociar para receber o documento mas, vendo a determinação da comunidade, nada puderam fazer a não ser atende-la.
Resex Tauá-Mirim: uma
estratégia de defesa da Zona Rural de São Luís e do Meio Ambiente diante do
avanço dos grandes projetos que ameaçam a existência de mais de uma dezena de
comunidades no Maranhão
As comunidades que participaram da Audiência Pública
(Cajueiro, Taim, Rio dos Cachorros, Camboa dos Frades), além de várias outras
na região, como todas as situadas dentro da Ilha de Tauá-Mirim, nos arredores
de São Luís, e as comunidades de Porto Grande, Limoeiro, Vila Maranhão, entre
outras da Zona Rural da capital maranhense, estão, governos após governos,
ameaçadas pelos chamados grandes projetos de desenvolvimento, que procuram se
instalar na região.
Além disso, elas e estão na área de abrangência da Reserva
Extrativista do Tauá-Mirim (Resex Tauá-Mirim), cujo projeto de criação aguarda
apenas a anuência do Governo do Estado para que seja implementada pelo Governo
Federal. A Resex inclusive já chegou a ter sua criação anunciada por várias
vezes pelos órgãos federais responsáveis, mas esbarrou na determinação do
governo estadual em não liberá-la: a área é utilizada como moeda de troca das
autoridades com o empresariado que tem ambições no local, em detrimento das
populações tradicionais que habitam a região. A área constitui um complexo e
frágil ecossistema composto de manguezais, brejos e matas e no qual estão
localizadas várias nascentes, território sobre o qual avançam empreendimentos
como Vale, Alcoa, fábricas de fertilizantes, termelétrica, e outros, cujos
licenciamentos são invariavelmente concedidos pelo governo estadual, com o
constante deslocamento das populações que lá habitam.
A criação da Resex é estratégica para impedir que a área
seja dizimada pelos empreendimentos e que suas populações desapareçam, e junto
com elas um pedaço do Maranhão: as comunidades tradicionais que habitam a
região são formadas por formadas por pescadores e agricultores detentores de um
saber específico que pode estar comprometido com o avanço do capital sobre
aquela área de São Luís, ocupada há mais de século por essas comunidades.
As comunidades veem na criação da Reserva uma alternativa
para permanecerem no local, bem como suas atividades de pesca, agricultura,
criação de pequenos animais, seus modos de vida, e percebem também que essa é a
forma de salvaguardar o equilíbrio ambiental na Ilha, protegendo aquela
importante área do avanço das indústrias sobre a região, empreendimentos que
sempre contam com o apoio irrestrito do Estado.
A proposta de criação da Resex, idealizada pelas comunidades
desde os anos 1990, ganhou força entre os anos de 2004 e 2005, no contexto do
malfadado polo siderúrgico que estava previsto para ser implantado em toda
aquela área. As comunidades resistiram e conseguiram afastar essa ameaça (que,
depois teve algumas de suas instalações estabelecidas em outros estados
causando prejuízos que estavam previstos para serem todos colocados sobre essa
região e, consequentemente, em toda a Ilha de São Luís). Desde então, a criação
da Reserva é vista como uma medida definitiva de se preservar a área, assegurar
os direitos dos moradores ao território, e contribuir para a preservação
ambiental.
Para o professor Horácio Antunes, de acordo com seu
posicionamento durante a realização da Audiência Popular no Cajueiro, se a
Resex Tauá-Mirim já estivesse criada, a ameaça pela qual a comunidade tem
passado nesse momento não estaria acontecendo. Ele destacou ainda os obstáculos
que o atual Governo do Estado sempre colocou para a criação dessa importante
ferramenta de preservação ambiental e das comunidades nela inseridas. “Está na
hora de a gente entrar firme na luta pela criação da Reserva”, disse. Para ele,
o novo governo deve assumir o compromisso, e “dizer a que veio, e dar a
permissão do Governo do Maranhão para a criação da Reserva Extrativista do
Tauá-Mirim”.
Rosana, do Taim, reforçou a importância de se lutar pela
criação da Resex. “Eles (as autoridades) já estão falando em combater a
elevação da temperatura em São Luís (recente estudo realizado pela Universidade
Estadual do Maranhão, apresentado em evento da própria SEMA, chamou atenção
para a elevação da temperatura na Ilha). Como que eles vão combater a elevação
da temperatura trazendo esses empreendimentos para cá?”, questionou.
Para Rafael Silva, a Resex é a melhor estratégia para defesa
de todas as comunidades do entorno, que estão sendo gradativamente afetadas,
com as pessoas sendo expulsas da região pelas empresas e pelo governo. “Tem que
fortalecer essa luta, que é uma luta coletiva das comunidades da área da
Reserva. Essa precisa ser uma pauta inegociável, que precisa ser levada para
esse novo governo, antes mesmo de ele assumir, porque eu tenho certeza que
esses grupos empresariais já estão indo lá fazer suas gestões junto ao novo
governo. Então, temos que fortalecer essa luta”, afirmou.
Dona Máxima, de Rio dos Cachorros, uma das entusiastas da Resex Tauá-Mirim
Irmã Ane, da Congregação das Irmãs de Notre Dame de Namur, símbolo das lutas populares no Maranhão...
...presente à Audiência popular!
Veículos da imprensa também acompanharam a Audiência Popular no Cajueiro
Comunidades resistem e se unem para assegurar os direitos também das futuras gerações
Veja matéria da TV Guará sobre o assunto:
Veja algumas imagens do que São Luís pode perder caso a história do bairro Cajueiro chegue ao fim em nome do pretenso desenvolvimento
Puçá, rede de pescar camarão, instalada na Praia do Cajueiro, em São Luís
Instalações
portuárias avançam sobre comunidades de pescadores e agricultores na Ilha do Maranhão.
Elas reivindicam a criação da Reserva Extrativista do Tauá Mirim como
forma de se protegerem do avanço indiscriminado sobre os manguezais,
áreas de mata, brejos e nascentes que ficam nas localidades onde as comunidades estão organizadas há
mais de um século.