Governo do Estado e empresa WPR se
aliam para realizar audiência pública no Comando Geral da Polícia Militar
Comunidade do Cajueiro reúne Defensoria Pública, Ministério Público,
pesquisadores, comunidades vizinhas, autoridades dos Legislativos municipal e
estadual, Delegacia Agrária, movimentos sociais e demais parceiros em Audiência
Popular para debater tentativa de implantação de projeto na área e as
violências a que as comunidades vêm sendo submetidas nesse processo
Cajueiro – 29 de
outubro de 2014
A comunidade do Cajueiro realizou, na tarde desta
quarta-feira, dia 29 de outubro, na sede de sua Associação de Moradores, Audiência
Popular para discutir os impactos da tentativa de implantação, na área, de um
complexo portuário pela empresa WPR.
Além dos impactos socioambientais, foram alvo das discussões
as truculências da empresa de segurança contratada pela WPR, desde que esta se
apresentou como proprietária da área do Cajueiro. Além de se sentirem
aterrorizados com a presença do que consideram uma verdadeira milícia armada,
os moradores passaram a conviver com cancelas proibindo o livre acesso em seu
território, coação para venda de imóveis na região e com a tentativa de
criminalização, com abertura de ações judiciais contra moradores e militantes
sociais.
A Audiência Popular realizada no Cajueiro foi, também, uma
resposta da comunidade, e de várias instituições que lá estiveram representadas,
à forma como a Secretaria Estadual de Meio Ambiente (SEMA), vem se portando em
relação à tentativa de instalação do empreendimento da WPR na região, sem
nenhuma preocupação com a idoneidade e transparência que um órgão público deve
observar. Um exemplo foi a tentativa de audiência pública na Vila Maranhão, que
os representantes da secretaria tentaram, a todo custo, realizar, mesmo sem o
aval da comunidade diretamente afetada. Os moradores conseguiram barrar essa
tentativa de institucionalização de uma ilegalidade, já que não foram
observados os prazos para convocação da audiência, nem foi observada a
publicidade exigida para os estudos de impacto ambiental, numa clara tentativa
de se acelerar, sem discussão, os procedimentos para que o empreendimento seja
instalado de qualquer maneira.
Por último, a Secretaria
Estadual de Meio Ambiente publicou, em seu sítio na Internet, na terça-feira,
dia 28 de outubro, a chamada para audiência pública a se realizar no COMANDO
GERAL DA POLÍCIA MILITAR, no dia seguinte, não respeitando, mais uma vez, os
prazos que devem ser observados. E mais: a assinatura da chamada traz a data de
21 de setembro, como forma de dar uma aparência de legalidade ao ato que foi,
na verdade, trazido a público somente no dia 28, na véspera de sua realização.
Além disso, a realização de uma Audiência Público no Comando
Geral da polícia Militar pode ser considerada algo completamente inusitado:
além de o Comando Geral ficar a quilômetros da comunidade impactada, a
realização de uma audiência nas dependências da Polícia tem, segundo interpreta
a comunidade, o claro objetivo de intimidar e impedir a efetiva participação
dos reais interessados no assunto.
Mesmo com
intimidação, Audiência Popular é realizada, contando com representantes de várias
instituições
Intimidação - Ao chegar à Associação de Moradores, os participantes da
audiência depararam-se com duas viaturas da Polícia Militar no local, com a
presença de vários policiais fardados. Questionados sobre quem teria solicitado
sua ida até a comunidade, eles informaram que foram acionados por seu
Comandante “para garantir a segurança”. Os policiais somente deixaram o local
depois que o representante do Ministério Público presente à audiência foi até
eles, e solicitou que se afastassem, já que não havia necessidade alguma de
suas presenças, e que elas inibiriam a participação das pessoas, e que essa
participação é que legitima uma audiência pública, onde todos podem e devem se
pronunciar aberta e livremente sobre o assunto da qual é objeto.
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Ao chegar à Associação de Moradores, os participantes da Audiência Pública depararam-se com viaturas e policiais |
Participantes da Audiência Popular no Cajueiro
Pelo Ministério Público do Estado do Maranhão, participou da
Audiência Popular no Cajueiro o promotor agrário Haroldo Brito; pela Delegacia
Agrária, o delegado Carlos Augusto; pela Defensoria Pública, o defensor Alberto
Tavares, do Núcleo Regularização Agrária da Defensoria; pela Secretaria
Municipal de Urbanismo, órgão da Prefeitura de São Luís, o superintendente da
área de Terras, Habitação e Regularização Fundiária, Anderson Lindoso; Saulo
Arcangeli, da Central Sindical e Popular, CSP-Conlutas; Rafael Silva, da
Assessoria Jurídica da Comissão Pastoral da Terra, CPT; Padre Clemir, da
Coordenação da CPT no Maranhão; professores, pesquisadores e estudantes da
Universidade Federal do Maranhão, membros do Grupo de Pesquisa: Desenvolvimento,
Modernidade e Meio Ambiente, GEDMMA; Saulo Costa, também da CPT; o deputado
estadual Bira do Pindaré (PSB), presidente da Comissão de Direitos Humanos da
Assembleia Legislativa do Maranhão; a representação do Gabinete da Vereadora
Rose Sales (PCdoB), da Comissão de Regularização Fundiária da Câmara de
Vereadores de São Luís; Congregação Irmãs de Notre Dame de Namur, representadas
pela Irmã Ane; moradores das áreas vizinhas, que também sofrerão impactos caso
esse projeto seja aprovado pelo governo do Estado, entre estes: Rosana e Maria
do Socorro, do Taim; Maria Máxima Pires, do Rio dos Cachorros; Dona Maria, da
Camboa dos Frades, além do grande número de moradores do Cajueiro que
compareceu à Audiência Popular, lotando a sede e o entorno da Associação de
Moradores, que foi a instituição que convocou a Audiência, na pessoa do Senhor
Davi.
Como presidente da Associação, Davi deu as boas-vindas e
declarou iniciados os trabalhos da audiência. Em seguida, Rafael Silva,
advogado, fez questão de ressaltar a importância daquele evento, instando todos
a participarem tranquilamente do processo: “Audiência Pública é esta que está
acontecendo aqui, não aquela situação
absurda que se criou no Comando da PM. Não estamos do lado de uma estrutura do
Estado que sirva de gabinete de grandes empresas, como acontece com a SEMA e
com a Secretaria de Indústria e Comércio”. Ele chamou atenção ara o fato de que
muitas das empresas beneficiadas com o aval rápido a seus projetos são as que
dão dinheiro que financia campanhas eleitorais. “Ninguém vai legitimar a farsa
que está sendo montada na PM a pedido da SEMA, importante ficar claro”, disse
Rafael que, contrapondo-se tanto a audiência na PM quanto à presença de
policiais que estiveram na Audiência popular no Cajueiro, afirmou: “Este é um
espaço em que as pessoas podem falar, denunciar. É um espaço de solidariedade”.
Ele solicitou que as autoridades presentes se posicionassem
no sentido de tranquilizar os moradores, garantindo a participação, para que
todos pudessem falar abertamente, tirar suas dúvidas sobre o empreendimento, e
contar como se sentiram coagidas com a presença dos seguranças da WPR na área.
O promotor público se posicionou: “Quero que todos fiquem
tranquilos em relação a isso. Todos podem falar”, completou. Rafael Silva
perguntou, então, ao delegado Carlos Augusto: “As pessoas têm liberdade para
falar o que pensam neste momento?”, ao que ele respondeu: “É direito de cada um
manifestar seu pensamento. Podem falar tranquilos, vivemos em um país livre”.
Por sua vez, o superintendente de Terras, representante da
Prefeitura, declarou: “não só podem como devem manifestar todas as suas
opiniões sobre o que tem acontecido. As coisas só podem acontecer, ouvindo-se a
comunidade. Esse é o entendimento da Secretaria e da Prefeitura”, afirmou.
Ministério Público:
Audiência na polícia é nula de pleno direito
Com o início das exposições, o promotor agrário Haroldo
Brito informou que iniciou conversas com seu par, Fernando Barreto, promotor do
Meio Ambiente, e que este, ao tomar conhecimento das ações da WPR e da
tentativa da empresa e da SEMA em realizar uma audiência pública às pressas na
sede da Polícia Militar, demonstrou não ter dúvidas de que essa audiência na
Polícia é nula de pleno direito. “E buscaremos, eu e o Dr. Barreto, sua
anulação na justiça. Se não anularmos no Tribunal, anulamos em Brasília (em
instâncias superiores), declarou.
Para o promotor, há indícios de práticas de improbidade administrativa
(crimes cometidos por servidores públicos) e de prática de crime (por
terceiros). Ele declarou ainda que somente não procede a extinção do inquérito
aberto em razão desses indícios, que precisam ser apurados (crimes poderiam ter
sido cometidos durante esse processo, por autoridades e por parte da empresa).
Como esse é mais um conflito envolvendo questão fundiária, o
promotor alertou para o crescimento do número de conflitos envolvendo posse de
terra no Maranhão, onde há uma lista de pessoas ameaçadas, geralmente
lideranças de camponesas. Dessa lista, disse ele, cinco pessoas já foram
assassinadas.
O promotor explicou que os moradores do Cajueiro têm
direitos a serem respeitados. “Vocês estão na posse há muito mais de cinco
anos. Isso garante o direito de todos vocês”. E repetiu: “Vocês têm direitos.
(Geralmente, o que vem acontecendo é que) só criminalizam a conduta dos
posseiros, nunca a dos ditos proprietários. Quando a reclamação é feita pelos
posseiros, nem é feita a queixa (a polícia não leva em consideração e não
registra a ocorrência)”, disse, atestando o que vem sendo denunciado há anos
pela CPT e pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, MST. Para tentar
diminuir essa verdadeira perseguição a quem ocupa a terra de boa-fé para produzir
e tirar seu sustento, o promotor informou que esteve com o secretário estadual
de Segurança, solicitando que os delegados fossem orientados a atender
corretamente os camponeses e a lavrar os registros.
Sobre o fato de a empresa pôr seus agentes para adentrar
quintais na comunidade, e marcar casas, sinalizando de forma ameaçadora e sem
consultar os moradores, ele orientou: “Na casa dos senhores não se pode entrar
sem mandado do juiz ou sem autorização dos senhores”.
Placas colocadas pela empresa na área do Cajueiro intimidando os moradores
Impactos que
podem ser causados pelo projeto do Terminal Portuário
Saulo Costa, da CPT, passou, então, a dar detalhes do que a
empresa pretende fazer com a área que pertence aos moradores do Cajueiro e suas
comunidades (o Cajueiro é formado ainda pelas comunidades de Parnauaçu e Andirobal).
“Temos que nos apropriar desse discurso, do que seja esse empreendimento, do
que a empresa está divulgando sobre ele, para sabermos com o que estamos
lidando”, disse, apontando que algumas dessas respostas podem ser encontradas
no Estudo de Impacto Ambiental e no Relatório de Impacto ao Meio Ambiente
(EIA/RIMA), peças fundamentais para se entender o que pode causar numa
comunidade um empreendimento desse porte.
Nesses documentos, Saulo explicou, a empresa assume que há
inúmeros impactos para a área (composta, como já dissemos, de uma rica
estrutura ambiental, como manguezais, matas, nascentes e brejos, essenciais
para o equilíbrio ecológico de São Luís). Saulo informou que, segundo esses
relatórios, a empresa diz que todo esse sacrifício pode ser recompensado com a
implantação do projeto, já que o Terminal Portuário traria desenvolvimento para
a região.
Além de Saulo Costa, membros do GEDMMA, que também
analisaram os documentos, levantaram pontos intrigantes do EIA/RIMA. O
pesquisador Jadeylson destacou que as peças não detalham a emissão de poluentes
e não demonstram impactos da preparação da área: se houver dragagem do mar na
região, a reprodução de peixes pode ser drasticamente afetada, já que, além da
areia, o maquinário utilizado draga também as espécies que se reproduzem no
local.
Chamou-se também atenção para o fato de que, antes de se
discutir o licenciamento de qualquer projeto para a área, o Estado tem que
responder uma importante questão: quem, de fato, é seu proprietário.
Afinal, a quem
interessa o projeto do Terminal Portuário?
A WPR surge no documento como sendo proprietária do local,
mas essa é uma questão que precisa ser resolvida: Durante o ano eleitoral de
1998, a ocupante do Governo do Estado, Roseana Sarney, que concorria à reeleição,
reconheceu o direito dos moradores, que lá já estavam há décadas, através da
entrega de títulos de propriedade condominial.
Durante a campanha de 2010, a mesma candidata, em novo
processo de reeleição, recebe mais de trezentos e quarenta mil reais para a
campanha, conforme consta sua prestação de contas no Tribunal Regional
Eleitoral, doados pela empresa Suzano que, embora não apareça agora no
EIA/RIMA, é beneficiada com a implantação do pretendido porto, por onde poderia
exportar seus produtos. No ano seguinte, logo nos primeiros meses de seu novo
mandato, a governadora desapropria a área em nome da Suzano Papel e Celulose.
Atualmente, segundo a própria empresa reivindica, a área teria
sido comprada, pela WPR, das mãos de um particular, que seria dono de toda essa
vasta área. Não fica claro, e o Estado não responde como essa área teria ido
parar nas mãos desse indivíduo, apontado pelos moradores como, na verdade, um
especulador de terras em São Luís.
A relação entre a tentativa de construção do porto pela WPR
e a Suzano reside no fato de que ele seria utilizado para escoar a produção
desta última, que embora atualmente não apareça nominalmente entre os que
pleiteiam a área, isso já foi de sua intenção, como atesta a tentativa de
desapropriação feita pela governadora do Estado em 2011 em benefício da empresa, alegando "interesse público". O EIA/RIMA também aponta,
entre os produtos a serem escoados pelo porto, pasta de celulose, item da pauta
de exportações da Suzano.
As doações para campanhas eleitorais no Estado não pararam
em 2010 (naquele ano, além de Roseana Sarney, Jackson Lago, também candidato ao
governo e hoje já falecido, recebera doação da Suzano, em quantia inferior à
sua oponente): segundo informações no sítio do Tribunal Regional Eleitoral do
Maranhão, durante as eleições deste ano de 2014, Victor Mendes, membro do grupo
político da governadora e ex-titular da Secretaria de Meio Ambiente, também
recebeu verba da Suzano para sua campanha. Talvez esses dados ajudem a explicar
a pressa em licenciar a área para a construção do porto, já que o grupo político
perdeu o comando do Governo do Estado, que será comandado por Flávio Dino, da
oposição, a partir do ano que vem.
Com tudo isso, a questão fundiária do local precisa ser
respondida antes que se aprove qualquer projeto para a região. Essa posição é
referendada pelo defensor público Alberto Tavares, que participou da Audiência
Popular. Ele ingressou com ação na justiça em defesa da comunidade, obtendo liminar
que proíbe qualquer tentativa de intimidação aos moradores, como as que vinham
sendo feitas pela WPR à luz do dia.
Segundo apontado na Audiência no Cajueiro, um dos possíveis
motivos para hoje a Suzano não figurar diretamente entre as maiores
interessadas nesse projeto pode estar ligados ao fato de a empresa precisar
manter sua imagem perante o mercado internacional. Para manter o selo de
certificação que detém, ela não pode ter seu nome vinculado a conflitos como o
que hoje a WPR promove no Cajueiro. Além do Cajueiro, a Suzano estaria
vinculada a diversos conflitos fundiários em comunidades camponesas, em
diversos estados brasileiros, incluindo outras áreas no Maranhão, como ocorre
no leste do Estado. Outro foco de grande conflito envolvendo a empresa está
situado no Estado da Bahia. Assim, áreas vitais para sua atividade, como transporte
e logística, são transferidas para terceiros, de forma que ela não pareça
diretamente ligada aos conflitos. No caso do Cajueiro, ela seria uma das principais
interessadas no projeto do Terminal Portuário, sendo, portanto, uma das autoras
do drama hoje vivido pelos moradores.
Moradores do Cajueiro
respondem a ameaças com resistência e participação na Audiência Popular
A Audiência Popular começou no início da tarde...
... e estendeu-se até a noite, sempre com boa participação...
...A Associação de Moradores ficou lotada, e a Audiência Popular foi acompanhada por participantes que se posicionaram até na área externa
Resistência
Os moradores vêm resistindo a ações que consideram
verdadeira violência. Um exemplo dessa resistência ocorreu quando bloquearam a
BR 135, e com ela o acesso ao Porto do Itaqui, como forma de denunciar a
atuação irregular da dita empresa de vigilância contratada pela WPR para
intimidar os moradores. Eles impediram, ainda, a realização da audiência
pública na Vila Maranhão por considerarem várias irregularidades em sua
convocação, sendo realizada fora da comunidade diretamente afetada, por vão
observar os prazos exigidos pela legislação e por não observar o princípio da
publicidade, através do qual deve haver comunicação em tempo hábil para que
todos possam participar. A Audiência Popular na área, com a presença de várias
autoridades e apoiadores da causa, é mais uma forma de se inserir na discussão
desse processo, inserção essa que vem sendo tolhida de todas as formas por quem
deveria assegurar sua participação.
Com a apresentação dos elementos que estão no EIA/RIMA e
discussão das relações entre as empresas envolvidas e autoridades públicas, e
que não aparecem à primeira vista e, pelo visto, são ocultadas propositalmente,
Bartolomeu Mendonça, também do GEDMMA, ratificando o que dissera Rafael Silva,
considerou que a audiência feita no quartel da Polícia Militar não é
reconhecida pela comunidade, que estava, ao contrário, discutindo em sua
Associação de Moradores os pormenores do empreendimento em questão, já que era
esse o objetivo de uma verdadeira audiência pública.
As falas da comunidade iniciaram por Dona Fátima, que questionou
se a criação da Reserva Extrativista de Tauá-Mirim, apontada como estratégica
para assegurar a permanência das comunidades e conter a ameaça representada
pelo avanço indiscriminado de grandes empresas na região, seria capaz de barrar
esse ataque, que estaria acabando com as comunidades da Zona Rural. Maria
Máxima Pires, entusiasta da criação da Reserva e moradora da comunidade de Rio
dos Cachorros, que também fica na área da Resex, chamou atenção para o fato de
esse ser uma alternativa ao avanço predatório sobre as comunidades. “O que as
pessoas (na verdade as empresas e o governo) não entendem é que o que queremos
é apenas o direito de permanecer nas nossas comunidades. E isso é divulgado
porque tanto o governo federal quanto o governo estadual não deixam os outros
saberem que nós existimos, mas é daqui que sai a verdura, que sai o peixe para
alimentar a cidade”, disse ela. Nesse sentido, a invisibilização a que são
submetidas facilita o processo de remoção das comunidades. A Resex pode ser
vista como uma estratégia para inverter esse processo, mostrando a todos a
importância de se preservar a área e o papel desempenhado pela existência das
comunidades nessa preservação, já que é de lá que elas tiram seu sustento, e
são conscientes da necessidade de se conservar o local para garantir suas
sobrevivências. Para Máxima, essa é uma oportunidade que os moradores têm de se
unir em torno da defesa de seus modos de vida e de seu território. E completa,
dizendo que a luta não deve ser apenas para permanecer, mas para que as
políticas públicas possam chegar até as áreas, com escolas, postos de saúde, e
toda a infraestrutura necessária: “O problema do Cajueiro não é só do Cajueiro,
mas de Rio dos Cachorros e de outras comunidades, como foi dito aqui. A luta
não é fácil, mas a gente consegue”, completou.
José da Silva, conhecido como “Seu Batata”, também foi enfático:
“Estamos sendo ameaçados. Tenho 78 anos de idade, nasci aqui na área. Eles (da
WPR) vinham de carro até o Andirobal e marcavam as casas. Não precisamos disso
aí (do empreendimento e da indenização que porventura a empresa daria para os
que se retirassem). Temos nosso meio de vida. Estamos na beira da praia. Temos
nosso caranguejo, nosso peixe, camarão. Eles fizeram audiência no quartel da
polícia para intimidar”, disse, e completou: “O Cajueiro sempre foi área de
sustentabilidade, que pesca e que planta e colhe. Se a gente sair daqui, vai
pra onde? Da Maioba até o Porto de Mocajituba eu conheço, e já está tudo cheio,
com esgoto, com conjunto habitacional. Só se a gente for para debaixo de uma
ponte”, indignou-se ele.
Seu Batata: "Estamos sendo ameaçados. Eles fizeram audiência no quartel da Polícia para nos intimidar"
Davi, presidente da Associação, demonstrou indignação com “a
forma como a empresa chegou aqui, a forma como está trabalhando. Pra que
audiência na polícia? Não vamos aceitar da maneira que está”. Ele lembrou que,
devido à luta da comunidade, a empresa chegou a processá-lo, o que ele considera
que foi feito por base em calúnias plantadas pelos representantes do projeto.
Padre Clemir, da CPT, ressaltou a relação que as pessoas da
região têm com a natureza, com o mar, em contraposição ao modo como a empresa
chegou querendo tirar as pessoas e dizendo-se dona. Ele questionou o fato de a SEMA
“correr com o processo” de licenciamento, no final do governo, atropelando todo
o ritual que deve ser observado num caso delicado como esse. E questionou: “O
que há por trás desse empreendimento?”. Clemir lembrou que a comunidade está
mobilizada e resistindo, como quando “fechou a BR” para chamar atenção ao grave
fato de a empresa ter colocado milícia armada dentro do Cajueiro. Para ele,
também é importante denunciar que o projeto do terminal portuário atinge outras
comunidades, como Jacamim e Porto Grande, e elas não estão sendo comunicadas.
“Essas informações não podem ser omitidas”, disse.
Ariovaldo, morador do Cajueiro, foi enfático: “Essa área não
é de vocês (da empresa): essa área é nossa!”, afirmou.
Bartolomeu, do GEDMMA, retomando a fala do Padre Clemir,
lembrou que há uma área de influência direta, e há, também, uma área de
influência indireta, e que esse não é um empreendimento pequeno – portanto
pequenos não são, também, os impactos gerados por ele. Outra crítica forte
feita pelos presentes diz respeito ao fato de a empresa investir na cisão da
comunidade, negociando individualmente com os posseiros, utilizando de
intimidação “e jogando um vizinho contra o outro, fazendo o trabalho que seria
do estado, que não apareceu, e que não disse para as comunidades o que seria o
empreendimento”.
Ressaltou-se também que os impactos vão para todos,
indistintamente, e que por isso todos na região devem se unir. Arnaldo, do GEDMMA,
lembrou um dado importante referente à dispersão de resíduos no ar, os chamados
“inaláveis, a poeira que se vai respirar. E isso está no EIA/RIMA. Vai
ultrapassar todos os níveis aceitáveis”, alertou, lembrando ainda que “a
Termelétrica Porto do Itaqui já joga na atmosfera uma quantidade considerável
de substâncias tóxicas que já atingem São Luís inteira: metano, cobre e outros
gases e metais sendo inalados”, disse. A termelétrica está instalada na região.
Processo de
licenciamento tocado às pressas pela secretaria de Meio Ambiente, mesmo cheio
de controvérsias
Para o defensor público Alberto Tavares, que mais uma vez
reforçou a necessidade de se definir a questão fundiária, há duas importantes
questões que dizem respeito a esse problema: uma é a ambiental, com os impactos
que os chamados grandes empreendimentos trazem para São Luís, e a outra é
justamente a regularização das terras. A empresa age no vazio da regularização
fundiária, aproveitando-se dessa indefinição: “O que a gente está defendendo
perante a SEMA? Que não é possível dar continuidade a esse processo de
licenciamento sem que a questão fundiária esteja resolvida”. Daí a importância
do processo de resistência da comunidade, que pressiona pelo respeito aos seus
direitos. Segundo ele, é possível verificar vícios até mesmo nos casos em que
algum morador tenha saído de sua casa mediante indenização, haja vista que,
tanto para a Defensoria quanto para o Ministério Público, há fortes indícios de
coação nesses casos. O defensor disse trabalhar no mesmo sentido da comunidade,
para assegurar-lhe o manifesto direito de permanência em seu local. Esses
também são os esforços de todas as parcerias instituições celebradas em defesa
da comunidade: promotorias do Meio Ambiente e Agrária, Defensoria Pública, CPT,
Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Maranhão, CSP
Conlutas, Comissão de Regularização Fundiária da Câmara de Vereadores, entre
outras.
Alberto Tavares, defensor público: Há fortes indícios de que a empresa que pretende se instalar na área tenha coagido moradores a vender suas casas...
...na região, é possível ver várias casas que já foram derrubadas a mando do empreendimento
“Estamos aqui para
enfrentar até o fim”
O Senhor Joca, 85 anos, em depoimento emocionado, afirmou:
“Moro aqui há 35 anos, e quero passar meus últimos dias de vida aqui. Não quero
vender essa área para ninguém. Estamos aqui para enfrentar até o fim”, disse,
convicto. “Seu” Joca planta, entre outros produtos, abacaxi, fruto vendido por
ele na Feira do Anjo da Guarda, bairro da área Itaqui Bacanga, em São Luís.
Seu Joca: Vamos resistir!
Dona Maria, também moradora, concordou que é preciso unir e
resistir, afirmando que “eles (da empresa) não compraram (a área) da mão de
nenhum de nós, que estamos aqui há 35, 40 anos, e não somos lixo, que é como essa
empresa quer nos tratar”.
Anderson Lindoso, da Superintendência de Terras da
Prefeitura, disse que a Secretaria de Patrimônio da União (SPU) foi informada
para que também se pronuncie sobre a situação. Ele destacou que as informações
que estavam sendo dadas durante a Audiência Popular servirão para municiar a
ação da Prefeitura na questão. “Só o fato de vocês estarem aqui esse tempo todo
já garante o direito de vocês, com o cuidado que vocês têm aqui (em usar e
preservar as características do local). Desenvolvimento não é só máquina, mas o
trabalho que vocês têm aqui, com a pesca e tudo o que vocês fazem. Vocês também
têm o assentamento: o Iterma fez a escritura em forma de condomínio para vocês.
Ninguém é obrigado a nada. Não são obrigados a vender ou a sair do que é de
vocês. Vocês estão executando um direito legítimo. Estou feliz em estar
presenciando esse momento de união entre os moradores, e com essas instituições
que estão aqui ao lado de vocês, Ministério Público, Defensoria e todos os
demais. É muito importante essa unidade, porque não adianta estas instituições
serem parceiras se vocês não estiverem unidos. Então é muito gratificante ver
essa união aqui”, declarou.
Anderson Lindoso, superintendente de Terras do município, comprometeu-se a levar as demandas da comunidade à Prefeitura
“Audiência com essa
pressa toda, no Comando da Polícia, não é coisa séria”. Além da Audiência Popular
realizada no Cajueiro, haverá audiência na Assembleia Legislativa sobre o
assunto
O deputado estadual Bira do Pindaré (PSB), por sua vez,
relatou a rapidez com que foi procurado pela empresa, logo em seguida às
manifestações da comunidade solicitando sua intervenção na questão. No dia
seguinte à interdição da BR 135 pelos moradores denunciando a presença de
milícia no local, o deputado fez um pronunciamento sobre a forma violenta de
ocupação pela empresa no Cajueiro. Imediatamente, no dia após seu pronunciamento,
16 de outubro, ele foi procurado em seu gabinete por pessoas que se
apresentaram como empresários e advogados da WPR, falando que compraram a área
para a construção de um porto de R$ 800 milhões, e que a área não estaria
dentro da Resex Tauá-Mirim (há decisão judicial que proíbe que seja levantado
qualquer grande empreendimento dentro da área da Resex enquanto sua criação não
for determinada pelo Governo Federal, que disse, por sua vez, depender de
anuência do governo estadual para proceder a criação da Reserva).
Durante a Audiência Popular, Bira solicitou aos
pesquisadores que estudam a área da Resex para que apresentem a documentação
que comprova a inserção do Cajueiro na Reserva. Ele também alertou para a mesma
questão que a Defensoria Pública apontou: “O que estamos vendo aqui em primeiro
lugar é a questão fundiária, de quem tem direito ao território. Se a aquisição
que eles dizem que fizeram é justa ou não é, se é legal ou não. Estive na área
e conversei com várias pessoas. O que eu percebi claramente é que as pessoas
não querem sair. Então não tem que ter pressa em relação a isso. Até hoje não
consegui dessa empresa explicação sobre o título do Iterma que foi dado (pelo
Estado) a vocês. Dado em 98, perto das eleições. Agora, no mesmo governo, da
mesma governadora, acontece isso com vocês. As pessoas estão aqui de maneira
mansa e pacífica. Não são invasores. Estão de maneira consolidada. Não se apressem.
Não se sintam pressionados. Aqui não há dúvida em relação ao direito (de vocês)
à posse. Quem saiu, teve sua casa derrubada pela empresa. Não tem porque
arredar o pé. Declaro apoio à luta dos moradores do Cajueiro. Audiência no
Comando da Polícia, com essa pressa toda, não é coisa séria. Não é audiência
pública: é fechada, a quatro portas. Dizer que estão trazendo o progresso
quando falam em instalação de grandes empresas, em porto de 800 milhões, é uma
cantilena que a gente ouve há mais de trinta anos e não resolve o problema”,
declarou o deputado.
O Presidente da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa, deputado Bira do Pindaré, agendou audiência na Assembleia para tratar do assunto. A audiência deverá contar com moradores, representantes do atual e do futuro Governo do Maranhão, e também da WPR
Saulo Costa comunicou que procedeu o georreferenciamento do
Cajueiro, via GPS, e que esses dados seriam repassados para a Secretaria
Municipal de Terras, Habitação e Urbanismo para contribuir com a delimitação da
localidade, demonstrando assim sua posição enquanto zona rural e sua
delimitação dentro da área da Resex Tauá-Mirim. O superintendente Anderson Lindoso
colocou-se à disposição para receber essa colaboração, e a contribuir para que
as políticas públicas cheguem até o Cajueiro, como a construção de creche, por
exemplo. Ele afirmou que a questão da regularização fundiária já está pautada
pelo órgão municipal, e comprometeu-se a levar as demandas da comunidade nas
demais áreas, como infraestrutura e educação, para a Prefeitura.
AUDIÊNCIA – Bira
do Pindaré chamou a comunidade para participar da Audiência convocada pela
Comissão de Direitos Humanos da Assembleia para discutir o assunto. Será dia 19
de novembro, às 14h30. Rafael Silva solicitou ao deputado que ele convide para
a referida Audiência os membros do secretariado do governador eleito.
Empresa de segurança
contratada pela WPR para aterrorizar moradores é clandestina
Carlos Augusto, delegado agrário, informou que a empresa que
aterrorizou os moradores (dizendo-se empresa de vigilância e segurança privada),
de forma intimidatória, foi multada. Segundo ele, a mesma empresa, Leões
Dourados, já havia sido advertida anteriormente.
Quanto à manutenção, pela empresa de segurança, de contêineres que servem como base de
apoio aos seus seguranças que atuam no local e dos quais a comunidade exige
imediata retirada, ele afirmou que estaria dependendo apenas de informações que
lhe seriam encaminhadas pela Polícia Federal para que pudesse agir, e que, se
estas não chegarem logo, iria pessoalmente buscá-las na PF. Sobre a realização
da Audiência e a luta dos moradores para preservar a comunidade, o delegado
Carlos Augusto asseverou: “a resistência de vocês vai surtir muitos efeitos”.
Sobre a necessidade de preservação da área, de acordo com as informações dadas
durante a Audiência Popular, ele considerou que “essa área verde é de
fundamental importância para todos nós da cidade”.
Delegado Carlos Augusto: Leões Dourados é irregular
Moradores são
conscientes de que ameaça somente poderá ser afastada se eles se unirem
Maria do Socorro, moradora do Taim, lembrou que esse era um
momento para as comunidades estarem brigando por infraestrutura, “e não ainda
contra essas empresas, para ficarmos aqui nas nossas terras. Esse porto vai
atingir a todos nós”, disse, conclamando a todos a darem as mãos nessa luta em
defesa da região.
Manoel Sodré, do Cajueiro, foi em igual direção: “devemos,
mesmo com nossas divergências, nos unir contra essas empresas que querem nos
expulsar daqui. São Paulo é um exemplo: lá, não tinha seca. Tem água, mas olha
o que fizeram, olha o Tietê. Nos anos 80, quando eu trabalhava na área da Vale,
aqui era diferente”. Ele conta que, naquela época, como pescador, a
profundidade do mar era maior. “Dava pé”, diz. “Hoje, tudo aterrado”. E
completa: “Essa área aqui não pode acabar. Não somos invasores. Invasores são
eles, que estão chegando agora. Segundo ele, o Governo do Estado tenta fazer
tudo às pressas, como um “rolo compressor” nos dois meses que faltam para
acabar a atual gestão. “Esse governo, que está aí desde que eu era criança,
quer tirar a gente. Mas cadê ele, ensinando a pescar, dando condições para nós
plantarmos? Querem é acabar com o que temos. Eu jamais quero sair daqui. Não
vamos deixar esse pessoal passar o rolo compressor em cima da gente”, falou.
União contra a
extinção das comunidades da Zona Rural de São Luís
Saulo Arcangeli, da CSP Conlutas, retomou a necessidade de
assegurar o direito das comunidades ao local que tradicionalmente habitam e de
onde tiram seu sustento. Segundo ele, há a necessidade de uma ofensiva de toda a
sociedade, em conjunto com os movimentos sociais e as comunidades da área, para
se garantir a Reserva Extrativista Tauá-Mirim, vista como estratégica para assegurar a preservação ambiental e o direito dos moradores aos seus territórios (veja detalhes mais à frente). Ele acrescentou que, como pode
ser visto, com a ampla participação assegurada à comunidade, a audiência que
pode ser considerada legítima é “essa aqui”, referindo-se à Audiência Popular.
“Devemos estar juntos até a vitória, até a vitória final”, conclamou.
Arcangeli, da CSP Conlutas: ofensiva para garantir a Reserva Extrativista do Tauá-Mirim
Dona Maria, da Camboa dos Frades, deu um depoimento
dramático sobre como as comunidades do entorno são tratadas pelos
empreendimentos. A Camboa dos Frades é hoje a comunidade mais afetada pela
Termelétrica Porto do Itaqui, que fica na região, e que foi responsável pelo
deslocamento da Vila Madureira. “A Camboa dos Frades não morreu, ela está só
precisando de ajuda, e por isso estou aqui. Ainda somos, lá, dez famílias que
resistem”, conta.
Ela revela que a mesma empresa que aterrorizou o Cajueiro,
contratada pela WPR para fazer serviços de segurança e que é considerada
irregular pela Polícia Federal, segundo informou o delegado agrário (a Polícia
Federal é um dos órgãos responsáveis pelo acompanhamento e controle das
atividades das empresas do setor de segurança), já agiu de forma parecida, com
truculência, na área da Camboa dos Frades. “Chegam dizendo que não podemos
fazer reforma nas nossas casas, nem construir, nem mexer em nada”, denunciou.
Uma mostra dos impactos causados pelas indústrias
da região sobre as comunidades, e que serve também para comprovar como esses
ataques atingem a todas elas e que por isso devem lutar unidas, está no fato de
que, ainda em 2012, comunitários da área da Vila Maranhão e do Cajueiro
denunciaram que a estocagem de carvão mineral no pátio (a céu aberto) da Termelétrica
(UTE Itaqui), com as chuvas de inverno, os resíduos atingiram o leito do rio,
poluindo-o com substâncias tóxicas. Naquela época, as duas comunidades
denunciaram ter sido obrigadas a diminui a atividade pesqueira em razão de a
reprodução do pescado ter sido atingida. Os moradores reclamaram na ocasião que
a fumaça e os resíduos da termelétrica teriam poluído as comunidades e o ambiente
dessa região da zona rural. O fato foi noticiado em rádios e sítios na
Internet.
Termelétrica Porto do Itaqui, que já foi da MPX de Eike Batista e hoje é da Eneva: poluição que ameaça diretamente a Zona Rural, bem como toda a Ilha de São Luís
Enquanto moradores
tratavam com profundidade da situação em que se encontram, Audiência Pública
sem respaldo transcorria na Polícia, sob orientação da Secretaria de Meio
Ambiente
Durante o desenrolar da Audiência Popular no Cajueiro,
chegaram informações da “farsa”, como classificaram os presentes, montada pela
WPR e pela SEMA no Comando Geral da Polícia Militar. Segundo as notícias, os
representantes do Governo do Estado reuniram pessoas de outras comunidades da
Ilha, que não da área diretamente afetada, e deram ares de legalidade ao
acontecimento. Representantes da SEMA chegaram a externar sua “felicidade” pela
conclusão de mais uma etapa para liberar o empreendimento que, segundo eles,
iria gerar empregos no Maranhão, discurso sempre acionado nesses casos.
Para os presentes, o importante agora é buscar, como dito
inclusive pelos representantes das instituições como Defensoria e Ministério
Público na Audiência Popular no Cajueiro, a anulação, na justiça, da audiência
realizada na PM. Para o professor Horácio Antunes, “é hora de juntar todo
mundo, unir forças para mostrar o que as comunidades estão querendo”. Horácio
classificou como vitorioso o movimento de resistência que vem sendo travado
pelos moradores do Cajueiro, destacando a presença das autoridades à Audiência
Popular, que lá estiveram e assumiram compromissos com a comunidade.
Viviane, do GEDMMA, lembrou que a audiência pública
realizada na polícia pode ser considerada ilegal também em relação ao Conselho
Estadual de Meio Ambiente, Consema, que não foi consultado sobre sua
realização.
Além da gigante Suzano, outra grande empresa que apareceu,
durante a audiência na polícia, como interessada no terminal portuário e que
até o momento ninguém sabia de seus movimentos nesse sentido, foi a WTorre, gigante da área de construção e engenharia.
Mais uma demonstração de que transparência não vem sendo o forte dos defensores
do projeto.
Como deliberações da Audiência Popular no Cajueiro, todos
concordaram na necessidade de se alertar toda a cidade sobre o que vem
acontecendo, bem com participar de forma ativa da Audiência convocada para o
dia 19 de novembro, às 14h30, na Assembleia Legislativa do Maranhão, chamando
as comunidades, os representantes das empresas, do atual governo e do
governador eleito. Também deverão ser reunidos os moradores que venderam suas
casas sob coação, para que tudo seja devidamente apurado.
Aproveitando-se a presença e disponibilidade para
interlocução do representante da Prefeitura, a comunidade também deve se reunir
para tratar dos problemas relacionados às políticas públicas e infraestrutura
da área.
Também deverá ser realizado um encontro das comunidades
tradicionais que passam por problemas semelhantes, como Camboa dos Frades,
Quebra Pote e outras. O Instituto Chico Mendes de Conservação da
biodiversidade, ICMBio, órgão do Governo Federal, já teria se posicionado
favorável a essa iniciativa.
Além de entrar judicialmente com o pedido de anulação da
audiência realizada na polícia, as comunidades também farão todos os esforços
possíveis para que o atual governo se posicione logo no sentido de reconhecer
as ilegalidades cometidas nesse processo e “zerar” as iniciativas irregulares
tomadas até aqui.
Dona Nicinha, moradora do Cajueiro, fez a última fala,
agradecendo a presença e disponibilidade de todos, reafirmando que a luta do
Cajueiro é para permanecer no seu lugar, “porque ninguém foi atrás de empresa
alguma para vender suas terras”.
Ao final, todos disseram um sonoro “NÃO” às empresas que
grilam terras e “SIM” à garantia de seus territórios, o que pode está
representado, também, na necessidade urgente de criação da Resex Tauá-Mirim. Concordando
com a necessidade de manter a união contra as ameaças na região, os
participantes encerraram a Audiência Popular cantando versos como:
“Pisa ligeiro, pisa ligeiro, quem não pode com a formiga não
assanha o Cajueiro!”
“Já chega de tanto sofrer, já chega de tanto esperar: a luta
vai ser tão difícil, na lei ou na marra nós vamos ganhar”.
ATUALIZAÇÃO:
Seguindo a mobilização em defesa de sua área, e dando
prosseguimento às deliberações da Audiência Popular, os moradores do Cajueiro
estiveram, durante a tarde da segunda-feira dia 3 de novembro, na sede da
Secretaria Estadual de Meio Ambiente, para protocolar o pedido de impugnação da
audiência realizada no Comando Geral da Polícia Militar do Maranhão.
Vários moradores e seus apoiadores estiveram presentes, e
seguranças contratados pela Secretaria tentaram tumultuar o protesto pacífico,
cujo maior objetivo é protocolar o pedido e sensibilizar a população de São
Luís para a para a situação do Cajueiro. A comunidade avança resistindo contra
a tentativa de ser riscada do mapa pelo conluio entre grandes empresas e o
governo do Maranhão.
Os moradores do Cajueiro conseguiram protocolar o pedido de anulação da autoritária audiência realizada na sede da Polícia Militar maranhense. Os representantes da Sema inicialmente não queriam negociar para receber o documento mas, vendo a determinação da comunidade, nada puderam fazer a não ser atende-la.
Resex Tauá-Mirim: uma
estratégia de defesa da Zona Rural de São Luís e do Meio Ambiente diante do
avanço dos grandes projetos que ameaçam a existência de mais de uma dezena de
comunidades no Maranhão
As comunidades que participaram da Audiência Pública
(Cajueiro, Taim, Rio dos Cachorros, Camboa dos Frades), além de várias outras
na região, como todas as situadas dentro da Ilha de Tauá-Mirim, nos arredores
de São Luís, e as comunidades de Porto Grande, Limoeiro, Vila Maranhão, entre
outras da Zona Rural da capital maranhense, estão, governos após governos,
ameaçadas pelos chamados grandes projetos de desenvolvimento, que procuram se
instalar na região.
Além disso, elas e estão na área de abrangência da Reserva
Extrativista do Tauá-Mirim (Resex Tauá-Mirim), cujo projeto de criação aguarda
apenas a anuência do Governo do Estado para que seja implementada pelo Governo
Federal. A Resex inclusive já chegou a ter sua criação anunciada por várias
vezes pelos órgãos federais responsáveis, mas esbarrou na determinação do
governo estadual em não liberá-la: a área é utilizada como moeda de troca das
autoridades com o empresariado que tem ambições no local, em detrimento das
populações tradicionais que habitam a região. A área constitui um complexo e
frágil ecossistema composto de manguezais, brejos e matas e no qual estão
localizadas várias nascentes, território sobre o qual avançam empreendimentos
como Vale, Alcoa, fábricas de fertilizantes, termelétrica, e outros, cujos
licenciamentos são invariavelmente concedidos pelo governo estadual, com o
constante deslocamento das populações que lá habitam.
A criação da Resex é estratégica para impedir que a área
seja dizimada pelos empreendimentos e que suas populações desapareçam, e junto
com elas um pedaço do Maranhão: as comunidades tradicionais que habitam a
região são formadas por formadas por pescadores e agricultores detentores de um
saber específico que pode estar comprometido com o avanço do capital sobre
aquela área de São Luís, ocupada há mais de século por essas comunidades.
As comunidades veem na criação da Reserva uma alternativa
para permanecerem no local, bem como suas atividades de pesca, agricultura,
criação de pequenos animais, seus modos de vida, e percebem também que essa é a
forma de salvaguardar o equilíbrio ambiental na Ilha, protegendo aquela
importante área do avanço das indústrias sobre a região, empreendimentos que
sempre contam com o apoio irrestrito do Estado.
A proposta de criação da Resex, idealizada pelas comunidades
desde os anos 1990, ganhou força entre os anos de 2004 e 2005, no contexto do
malfadado polo siderúrgico que estava previsto para ser implantado em toda
aquela área. As comunidades resistiram e conseguiram afastar essa ameaça (que,
depois teve algumas de suas instalações estabelecidas em outros estados
causando prejuízos que estavam previstos para serem todos colocados sobre essa
região e, consequentemente, em toda a Ilha de São Luís). Desde então, a criação
da Reserva é vista como uma medida definitiva de se preservar a área, assegurar
os direitos dos moradores ao território, e contribuir para a preservação
ambiental.
Para o professor Horácio Antunes, de acordo com seu
posicionamento durante a realização da Audiência Popular no Cajueiro, se a
Resex Tauá-Mirim já estivesse criada, a ameaça pela qual a comunidade tem
passado nesse momento não estaria acontecendo. Ele destacou ainda os obstáculos
que o atual Governo do Estado sempre colocou para a criação dessa importante
ferramenta de preservação ambiental e das comunidades nela inseridas. “Está na
hora de a gente entrar firme na luta pela criação da Reserva”, disse. Para ele,
o novo governo deve assumir o compromisso, e “dizer a que veio, e dar a
permissão do Governo do Maranhão para a criação da Reserva Extrativista do
Tauá-Mirim”.
Rosana, do Taim, reforçou a importância de se lutar pela
criação da Resex. “Eles (as autoridades) já estão falando em combater a
elevação da temperatura em São Luís (recente estudo realizado pela Universidade
Estadual do Maranhão, apresentado em evento da própria SEMA, chamou atenção
para a elevação da temperatura na Ilha). Como que eles vão combater a elevação
da temperatura trazendo esses empreendimentos para cá?”, questionou.
Para Rafael Silva, a Resex é a melhor estratégia para defesa
de todas as comunidades do entorno, que estão sendo gradativamente afetadas,
com as pessoas sendo expulsas da região pelas empresas e pelo governo. “Tem que
fortalecer essa luta, que é uma luta coletiva das comunidades da área da
Reserva. Essa precisa ser uma pauta inegociável, que precisa ser levada para
esse novo governo, antes mesmo de ele assumir, porque eu tenho certeza que
esses grupos empresariais já estão indo lá fazer suas gestões junto ao novo
governo. Então, temos que fortalecer essa luta”, afirmou.
Para acompanhar mais sobre a Resex, siga https://www.facebook.com/resextaua
Dona Máxima, de Rio dos Cachorros, uma das entusiastas da Resex Tauá-Mirim
Irmã Ane, da Congregação das Irmãs de Notre Dame de Namur, símbolo das lutas populares no Maranhão...
...presente à Audiência popular!
Veículos da imprensa também acompanharam a Audiência Popular no Cajueiro
Comunidades resistem e se unem para assegurar os direitos também das futuras gerações
Veja matéria da TV Guará sobre o assunto:
Veja algumas imagens do que São Luís pode perder caso a história do bairro Cajueiro chegue ao fim em nome do pretenso desenvolvimento
Puçá, rede de pescar camarão, instalada na Praia do Cajueiro, em São Luís
Instalações
portuárias avançam sobre comunidades de pescadores e agricultores na Ilha do Maranhão.
Elas reivindicam a criação da Reserva Extrativista do Tauá Mirim como
forma de se protegerem do avanço indiscriminado sobre os manguezais,
áreas de mata, brejos e nascentes que ficam nas localidades onde as comunidades estão organizadas há
mais de um século.
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